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O SUICÍDIO POR FALTA DE RECONHECIMENTO DA GENIALIDADE

Vincent van Gogh era um espírito atormentado pela grandeza de ideais em nome dos quais sacrificou sua curta existência de 37 anos: a arte e a humanidade, fixado em camponeses e trabalhadores. Uma alma capaz de renunciar a tudo para transbordar seus sentimentos mais profundos. Metade de si desejava dar vazão a seu amor e não encontrava o jeito de fazê-lo em conflito permanente com sua outra metade por dar vida a uma pintura que mal ecoava entre seus contemporâneos.
Por 18 anos escreveu com frequência para seu irmão Theo, extravasando seu desespero e suas ambições, fonte essencial de informações sobre sua vida e a obra do artista, e por 10 anos pintou com renovado frisson 860 telas a óleo. Tinha horror à técnica acadêmica e afirmava que queria pintar incorretamente (fora dos padrões estabelecidos), para sua falsidade se tornar mais verdadeira do que a verdade literal.
Pesavam em sua consciência as incertezas de sua trajetória de vida e a precária situação econômica aplacada pelos cuidados materiais e morais que seu irmão Theo a ele dedicava. Quatro anos mais novo, como marchand, se sacrificava para ajudá-lo, garantindo-lhe o dinheiro para sobreviver e permitindo a Vincent ser pintor em tempo integral. Uma grande sensibilidade artística que os manteve unidos na vida e até a morte.
Van Gogh sempre sustentou que seguiria seu rumo como rebelde porque tinha ideias que radicalmente divergiam dos chamados respeitáveis senhores que privilegiam sujeitos que pensam como eles. Pintava o que via e sentia, danem-se as regras! Sabia que encarnaria um eterno solitário e que seu trabalho teria a conotação de uma missão religiosa – a arte, seu único refúgio. Passaria fome e viveria dificuldades. Um homem que exigia tanto de si mesmo e que chegou a arruinar o seu corpo e sua mente. Obcecado em encontrar uma mulher, caso contrário converter-se-ia em pedra, foi rejeitado por várias delas. Quando finalmente uma solteirona holandesa o aceitou, os pais dela proibiram o casamento, o que a levou a se suicidar ingerindo veneno.
Os dois meses que van Gogh e Gauguin passaram juntos no sul da França, pintando, discutindo arte apaixonadamente, bebendo e frequentando bordéis, terminaram com van Gogh ameaçando Gauguin com uma navalha, a mesma navalha com que o holandês viria a cortar o lóbulo de sua orelha esquerda na noite daquele dia trágico. Iniciar-se-ia em dezembro de 1888 um longo ciclo de crises, desânimos, esgotamentos, trabalho árduo e momentos de êxtase. Voluntariamente ingressou num manicômio e lá permaneceu por um ano. A convivência com doentes mentais libertou van Gogh: perdeu o medo da loucura, da qual ele mesmo acreditava ser portador. Apesar de profundamente perturbado e presa de alucinações, pintava uma obra-prima atrás da outra, legando à Humanidade uma produção inédita na história da arte. Inspirado pela Natureza, pintou ciprestes, vicejantes árvores frutíferas, flores e campos de trigo carregados de sua cor predileta, o amarelo. Em seus últimos 70 dias, van Gogh pintou setenta telas. Embora sob tensão constante, estava tecnicamente no auge de suas forças com pleno controle das zonas de cor forte sem sombras.
No entanto, van Gogh vivia desesperançado com a falta de perspectivas e com a dependência financeira de seu irmão. Delirava obstinado com o dia em que veriam seus quadros valendo mais que o preço das cores com que são pintados, e mais do que o preço de sua vida, em geral bastante árida. Ao final de junho de 1890, uma carta de Theo quebrou por completo a dimensão de seus projetos. Nela, seu irmão descrevia as dificuldades que atravessava na sua atividade de marchand e a debilidade física que acometia a ele e a sua esposa. Van Gogh encerrou sua última carta para Theo indagando para que tudo isso. Foi para o campo com uma pistola e atirou no seu próprio estômago. Sobrevindo à sua cabeça na agonia, que durou dois dias, quem diria que a vida pode ser tão triste. Prefiro morrer de paixão a morrer de tédio. Um pintor tem que pintar, talvez exista alguma coisa depois disso. Theo correu a ficar do seu lado nessas derradeiras horas, balbuciando “ele era tão, tão meu irmão”, vindo a ficar louco e a morrer seis meses depois do suicídio de van Gogh, em 29 de julho de 1890.
Louco é o mundo, que só pôde entender a genialidade de Vincent van Gogh depois que partiu e alcançou a outra margem do rio.

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Antonio Carlos Gaio
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