PERNAS TRÊMULAS
1 de fevereiro de 2000
Tristeza da torcida brasileira que gritava timinho para a seleção do Wanderley,
que jogava com três cabeças-de-área diante da poderosa esquadra da Venezuela. Ou
melhor, vaiava o Wanderley da seleção, que traíra seus novos princípios
implantados no Corinthians, tornando-o vitorioso até hoje. Meio-de-campo
criativo abre buracos na defesa, perigoso em início de competição. Treme de medo
de ser logo eliminado na fase de classificação do Pré-Olímpico. Justo o
comandante-em-chefe Luxemburgo, que afirmara categoricamente na pífia final do
Mundial de Clubes que “o medo de perder tira a vontade de ganhar”. Normal,
portanto, dar ordens claras de não ouvir vaias no estádio, e desafiar a torcida
para uma queda-de-braço.
Voltemos no tempo quinze dias. Antônio Lopes lembra-se do coração, do campeonato
perdido para o Flamengo e da eliminação do Brasileirão pelo Vitória, e resolve
não correr o risco de substituir Edmundo na decisão do Mundial de Clubes. A
partir do segundo tempo, suas pernas tremem, o cérebro paralisa e os olhos se
esbugalham diante do espectro de São Dida. Parara no tempo e no espaço, a
exemplo de Heleno de Freitas, o temperamental craque botafoguense. Como
substituí-lo depois dos maravilhosos gols contra o Manchester United e South
Melbourne? Ademais, isso já acontecera com Zico, Baggio e Platini. Em fase de
recuperação pela perda do pênalti, Edmundo, contudo, ainda delira, sonhando com
um time de ponta na Itália capaz de disputar o título.
Voltemos no tempo dois meses. Depois de conquistar brilhantemente a Libertadores
da América, em batalhas gloriosas contra o Vasco da Gama e o Corinthians, o
Palmeiras deixa-se vencer pela ansiedade do resguardo de seis meses e joga fora
de suas características na outra decisão do Mundial de Clubes. Na base do abafa,
como se fosse o time inglês. Sem criatividade e manha, ao ter incorporado o
espírito do técnico Felipão para que as pernas não tremessem. A direção do
Palmeiras não suportou o fracasso, rifou o time inteiro. Faltou habilidade.
Voltemos no tempo três meses. O Flamengo crucifica Romário, cuja liderança
perniciosa conduziu a imensa nação dos crentes rubro-negros ao Holocausto. O
Deus Romário não havia conquistado os títulos que prometera, desde a Copa do
Mundo de 94 seus milagres foram escasseando, apesar dos gols assinalados, em
fartura e em genialidade. As pernas da direção do Flamengo tremeram quando
dispensaram o deus. Quiseram até voltar atrás. Afinal de contas, era Deus.
Faltou talento.
Tristeza da torcida que entra em campo
para ver gols, craques e dribles. Que grita timinho, inconformada com a falta de
talento no mundo. Que não entende porque Rivaldo é eleito o número 1 e, quando
veste a amarelinha, se apaga. Numa era em que jogador fratura a perna, pura e
simplesmente por estresse, não resta a menor dúvida de que grassa no futebol uma
epidemia de pernas trêmulas. A era Ronaldinho. Ainda estamos de cabeça baixa.
Perdura a síndrome da convulsão.
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