CÉU DE BRIGADEIRO
13 de Agosto de 2001
Que céu de brigadeiro nada, o
mar não está pra peixe e a terra há de engolir os que contra ela pecam,
maldiria um crente de carteirinha.
O que levou o comandante Rolim a desaparecer
quando a TAM iria superar a VARIG e realizar vôos internacionais de mil
e uma noites? O tapete mágico ele já estendia para seus clientes
entrarem no avião e voarem.
O que levou Fittipaldis, Rômulo Arantes e
Hebert Vianna a não se distanciarem dessas ocorrências funestas?
Malgrado, ultraleves serem menos suscetíveis a catástrofes, conforme
preceitua nosso Saint Exupéry, Armando Nogueira, que não vê o menor
perigo.
Ao se atrair por modelos de rara beleza, que
fingem se retrair ao tapete que ele desenrola para elas passarem, Diniz
não teve olhos para o mau tempo na região, sequer a turbulência, o mar
encapetado, o breu gélido e a hipotermia, que convidavam o azar a cercar
o helicóptero que decolou desprovido de coletes salva-vidas, rumo a um
heliponto sem instrumentos. Injustiça acusarem o mar de traiçoeiro se
encapelado, gelado e sombrio, consciente de seu poder ele não se rebaixa
a negociações, por puro sadismo em observar se prevalece a solidariedade
coletiva ou iniciativas individualistas.
Foi cada um por si e Deus por todos, um salve-se quem puder, a
sobrevivência falou mais alto, tanto que os que deram na praia chegaram
com horas de distância um do outro. A queda não foi brusca, não
ocasionou ferimentos, permitindo que conversassem sobre o que fariam em
cima do helicóptero. Ao ser lambido pelo mar, o piloto entrou em pânico,
viu crescer a onda que o levaria à morte. Venceu a maratona os mais
aptos fisicamente, os fracos se cansaram e afundaram absolutamente sós
no oceano hostil.
É por essas e outras que, cada vez mais, é
verdadeiro o amor no cinema, dá vontade de pular da poltrona e entrar
tela adentro. Não foi por outro motivo que Titanic e Leonardo DiCaprio
ficaram famosos, graças à abnegação do amante pobre endeusando a amada
Kate Winslet, quando se ofereceu em sacrifício ao iceberg on the
rocks. Ele não saiu de perto dela um minuto sequer.
O que se passa dentro dessas maravilhosas máquinas voadoras cujos
comandantes desdenham das condições do tempo? O que é o morro dos ventos
uivantes senão uma leve turbulência? Quem comanda de verdade, quem paga
ou quem pilota? Que poder é esse que afronta o controle aéreo, o vento,
as correntezas, o invencível mar, o escuro da noite, os fantasmas que
assolam e esmigalham a fortaleza máscula que pensa que pode viajar a
hora que bem entender? Julgam que o etéreo pertence a eles, que dominam
o ar que respiramos.
O que fazem esses homens com suas vidas? Tão ciosos de poder, a ponto de
confundir mega com meiguice. O poder nas alturas divorcia do amor na
terra, tornando-os extremamente fugazes, a perder de vista no horizonte
com suas asas voadoras. Tanto vão longe, que, quando se vão, esquecemos
dos que foram, debalde os esforços feitos em vida para marcar presença e
constar de álbum de figurinhas, fichinhas perto de Vasco da Gama,
Amündsen, Santos Dumont e Charles Lindberg.
Para quê discutir a instabilidade do tempo
se nenhum teste de sêmen é capaz de explicar essas tragédias que se
repetem para a gente não se esquecer, que, a 500 metros do litoral, uma
letargia pode nos deixar mole e prestes a nos afogar, depois de nadar,
nadar... e morrer na praia. A menos que Fernanda Vogel, como iemanjá, em
epifania, revelasse o obscuro de que atrás de uma onda, sempre vem outra
onda.