PENDOR PARA O ATRASO
27 de Agosto de 2001
O Código Civil que regula os direitos da família, aproximando o
casamento do fio da navalha, em virtude da posse sobre coisas alheias
que prejudica a sucessão no caso de traição, tumultuando a parceiragem e
sua partilha, data de 1916.
Começou-se a ruminar sobre sua modernidade
nos 6 meses de Jânio Quadros, chegando a um texto-base na intercessão de
Médici com Geisel, assim se passaram 26 anos, até a Câmara atual aprovar
para entrar em vigor daqui a 2 anos.
Tudo no Brasil chega atrasado, é a República proclamada antes que o
Barão de Mauá engolisse o Brasil, a escravatura abolida depois da
Jamaica, os militares reclamando de Vargas e cravando 22 anos na sua
ditadura, prolongando a estrela de Sarney revigorada pela diverticulite.
Resultado da inequação: Jânio varrendo a corrupção somado a Collor
caçando marajás equivale a reeleição, agora presente garantindo a
vocação para o atraso.
A virgindade era motivo de anulação do
casamento, de tanto fustigarem o hímen, se era complacente ou não, ele
acabou rompendo com o tabu e transformando o brotinho de Copacabana em
lolita, reduzindo o limite de idade em querer ser mulher, digamos, para
13 anos, ou menos, conforme grotões em que senhores respeitáveis
satisfazem a sanha do poder.
Piada reduzir a maioridade para 18 anos,
quando playboys já se anabolizam em academias aos 14, digamos, para
ganhar corpo e roubar som dos carros dos amigos do pai, agredir gays e
fechar boates, reduzindo o mercado dos pivetes, de menos idade ainda,
que se espelham na folha corrida dos parlamentares.
O adultério
tanto quanto o sujeito galinha caíram em desuso, já nos esquecemos de
que o sexo antes do casamento era um ato de desonra que a infeliz virgem
cometia contra os pais, a caminho da prostituição. Reparação, somente
com as bodas. Apertões, encosta daqui e dali, esfrega, sarro, nem sempre
com o noivo, havia que coibir a mulher galinha antes que ela subvertesse
os bons costumes. Já nos olvidamos que o homem procurava dar à amante
preferida um tratamento especial, condigno de uma segunda esposa.
Alugava um apartamento para os encontros furtivos, instituía a passagem
obrigatória e concedia uma pensão a título de purgar seus pecados e
manter as aparências. Queimaram-se os sutiãs, a mulher ganhou a carta de
alforria para também trair, abandonar e... tintim para o teste do DNA: o
tiro de misericórdia no senhor-de-engenho e no seu séqüito de escravas
do desejo.
Respeitar a mulher como cabeça-de-casal não constitui propriamente um
avanço, pois o homem como soberano nas decisões familiares já entrou em
decadência há séculos. Ela se casava legalmente, se separava obedecendo
à lei, e não era ninguém, quando já sustentava inúmeros marmanjos
perdidos por aí. Se pobre, a faxina garante o leite das crianças,
enquanto o marido encosta. Se classe média, a prisão ameaça os que dão
beiço na pensão, enxotando-os para o colo da mãe por conta do
desemprego. Se rica, o contrato pré-matrimonial previne quanto a
diabruras deles em busca da juventude e farta beleza a preço baixo.
No momento em que se discute clonagem,
aluguel de útero e teste de DNA, o Congresso revela quão antenado está
com a reforma dos costumes e o apreço a tudo que cerca as relações de
afeto, ao indicar o pecuarista pernambucano Fiúza - integrante da tropa
de choque de Collor que renunciou ao mandato para escapar da cassação no
escândalo do Orçamento - para fechar o caixão e rejubilar-se com a
façanha de em pouco tempo realizar o que só se faz em 100 anos.
Pêndulo, ó pêndulo meu, que pendor para o
atraso! Entre o queijo de coalho e a caninha da Serra, não fareja a
falência das identidades masculina e feminina na conjunção carnal e a
futura exigência de pré-requisitos para se habilitar a exercer o sexo
com que nasceu, a fim de que nos previnamos quanto ao mau uso e seus
filhotes.