MALMEQUER E BEM-ME-QUER
11 de Outubro de 2002
Malmequer e bem-me-quer designam plantas
que pertencem ao mesmo tronco da família das compostas e que, na geléia
geral da botânica, significam que de onde você mais espera é dali mesmo
que a esperança falece, o peixe morre pela boca e daquele mato não sai
coelho. Daí se apelar para o jogo pueril e machadiano do bem-me-quer,
malmequer, ou, ela me quer, ou ela não me deseja.
Quando um homem deseja aquela mulher só
para si, proclama aos quatro ventos que a quer, quer muito, como nunca
desejou alguém assim antes. Confessa ser a mulher da vida dele. Fala
sério, compenetrado, como nunca o fora nos seus primórdios, a ponto de
querer viver junto, casar ou amar incomensuravelmente entre as quatro
paredes. Num relacionamento conseqüente e profundo. Provavelmente
estiveram juntos em outra encarnação ou estão a resgatar algum elo
perdido de lá. Ele seria capaz de um pacto consigo mesmo, de forma a
conquistá-la, abrindo mão de outras mulheres, para que elas acreditem e
o levem a sério. Reiterará a promessa na sepultura da mãe, se
interditará ao se deixar seduzir por olhos negros, pela boca que sangra
e a bunda arrebitada, para todo o sempre. Por entender que o traseiro
pode ser maravilhoso e divino, mas igualmente terrível e conservador,
agastando-lhe o prazer.
No entanto, todavia, contudo, ela dá
corda, deseja apenas manter o desejo dele em banho-maria, porque lhe faz
bem a corte, ser bem tratada, amável e cavalheirescamente, produto em
falta. O homem, por sua vez, interpreta como luxúria, a finalidade é
deixá-lo apaixonado, gamado, de quatro para ela, porque a moça ao mexer
com seus brios, o faz sentir-se rejeitado. Nessa fração de segundo,
morde a isca, o conquistador se sentiu desafiado, e ela com quantos paus
se faz uma canoa.
Aí ela vai fingindo que está caindo na
cantada, pois não existe coisa melhor que o assédio educado, do que o
embevecimento do varão a querer provar a todo transe que ela é a sua
Cinderela. A meta impossível é a de concentrar rasgos, paixonites e
desvarios por sobre sua mulher, mesmo quando se sente inferiorizado por
ela não confessar que o ama conforme ele a ama, embora explicitado
através de indiretas de forma a não se comprometer.
Ambos fecham a raia conspurcando a
terminologia do amor, tornando abjeto o nexo causal que os pôs um
defronte o outro e cometendo o verdadeiro pecado original, desgostando a
Deus que não criou Adão e Eva para testemunhar tamanha lambança.
Entranhado o desafio, desafiando o poder
do feminino, auscultando um “eu não gosto de você”, que lhe provoca mau
hálito e gosto de derrota, tudo termina quando se cansa, ele vai embora,
no entanto, nunca mais irá esquecê-la, e ao trauma. Irá se casar de novo
e sua futura mulher não tolerará seu passado, provavelmente o proibirá
de mencioná-lo.
Por outro lado, do lado ímpar, que
contraria o par, pelo lado gauche, ela se esgueirará e escapará do beco
sem saída. Irá esquecer, não dará bola, exceto das saudades da corte.
Arrepender-se, apenas quando estiver só.
Sábia a botânica em que navegam livremente
androginia e hermafroditismo, mas como não somos vegetais, até prova em
contrário ao entrarmos em coma vegetativa, malmequer, bem-me-quer, é o
Deus de nossos instintos básicos.