UMA BOA IDÉIA
13 de Maio de 2002
No espoucar da Revolução Comunista em que se
preconizava desde a erradicação da pobreza e da religião, passando pela
igualdade econômica entre homem e mulher, até a foice e o martelo
forjarem uma sociedade a ferro e fogo, Leandro Konder enriquece nosso
pensamento lembrando que Georg Lukács afirmou corajosamente que política
é um meio, a cultura é que é o fim. Pura alienação de caráter
intelectualóide?
Décadas voaram e as mudanças espetaculares não atingiram o
âmago da questão como o soco na boca do estômago, obrigando ao século
XXI a repensar a cultura na sua gestação, por onde semear os valores
mais duradouros e por onde enraizar as convicções em um campo de batalha
atípico, pois nele se confundem, entrelaçam e, não raro, se fundem, como
sombras na noite, naturezas aparentemente incompatíveis. Como a querer
realçar disputas políticas, refregas sociais e novas expressões de amor,
pautado pela angústia do artista em fazer pousar a idéia, encontrar um
estilo para colher um fruto que suavize sua inquietação, na doce ilusão
de neutralizar as manhas da ideologia que inevitavelmente o envolve.
Obrigando-o a tomar partido, assumir uma posição diante do panorama
oferecido pelas corporações existentes, em contraponto com a inércia que
nos mina dia-a-dia, empurrando-nos para o desforço contra nossa própria
essência imersa em dúvidas - limitações pessoais causam azia e má
digestão.
Por mais que se reinvente o mundo ou candidato a
presidente ou se crie factóides para combater a desigualdade social, não
se consegue camuflar a importância de se evoluir entre pensamentos
divergentes, compelidos a colidir uns com os outros na defesa de boas
idéias e crenças que valham a pena viver. Procuram ajustar-nos ao padrão
globalizante de manipular informações e retocar estatísticas, impedindo
o avanço de brigadas ligeiras em futucar os controladores da divulgação
concentrados nas prioridades do que consumir em cultura, provocando
insônia em quem define os critérios de seleção - um dia ele poderá ser
expurgado. Não é por outro motivo que se vende a falácia de que cultura
não dá lucro, para, como apêndice de corporações, continuar a nos
governar explorando e escravizando nossas mentes pelo instrumento tão
antigo quanto a prostituição: a tirania que sacrifica uma boa idéia.
Dando margem a que artistas e cidadãos, na labuta diária a que
estão sujeitos, se cansem das lutas insensatas que dilaceram este pobre
mundo. Em cada discussão, cada polêmica, cada debate, estamos na alça de
mira da bala perdida, somos julgados, desdenhados, condenados. No
aguardo do veredicto, esperamos ingenuamente por alguém capaz de
inverter a ordem natural das coisas para nos tirar desse mau momento.
Como pobre desconfia de esmola, ele até aparece, mas vira a casaca ou
finge que não vê.
Quem não adora se colocar no lugar de mestre, conselheiro,
juiz, mediador, irmão mais velho, confessor, crítico especializado,
mentor espiritual? De que adianta se não se tocam se realmente sentimos
necessidade deles, se todos querem ser a salvação da lavoura, um porto
de apoio, pais e mães que não conseguiram ser, só almejam ocupar a
tribuna e como Policarpo Quaresma acabar com as saúvas. Estão mais
interessados na mise-en-scène que lhes confere um ar de respeitabilidade
e prestígio do que em nos defender.
Que
tal adotar uma atitude exclusiva e requintada com relação à arte e à
vida, fria e distante em que sua estética predomine procurando
captar o Belo, na diversidade de emoções e sentimentos que ele
suscita no homem, antes que o pessimismo o consuma? Por que não, se
não tá devendo pra justiça, se você se basta com o pouco que tem, se
jamais tocou em um fio de cabelo ou difamou quem quer que seja?
Mas
você não está livre de escroques que o rodeiam, de ser obrigado a
propor ações em juízo, e de correr o risco de perder se alguém
entrar com algum processo contra ti. Quando tu andas, mais tu te
afastas.
Quem
não tem mais sonhos nem projetos e se desgoverna sem objetivos,
perde a noção do que é verdadeiro e se afoga num mar de equívocos,
tropeça na própria língua e acusa os que pensam e criticam de serem
os donos da verdade, carcomido pela inveja. É quanto custa uma boa
idéia.
Sai
mais barato que o revolucionário alisamento capilar que lhe dá a
aparência de japonesa, ao longo de seis meses que dispensam a
escova, aposentam a chapinha e o secador. Por 400 dólares, cacheado,
encaracolado, crespo e eriçado se tornam o fino que satisfaz, o
charme .
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