MEDO EM REVISTA
25 de Outubro de 2002
É um péssimo exemplo para a juventude que
artistas-cidadãos de mais de 50 afirmem ter medo, a pretexto de
reafirmarem sua opção eleitoral.
Por delinearem um futuro próximo de
incertezas, quando a população majoritária de jovens e sem emprego
anseia por um lugar ao sol e não tem outra alternativa senão apostar num
país com mudanças. Eles precisam construir com urgência seu próprio
caminho, não podem se dar ao luxo de se restringir ao medo.
Prejulgar num exercício político que tudo
vai piorar, cabe, mas 8 anos de estabilidade financeira com inflação sob
controle e um presidente que nos orgulhava diante de seu desempenho como
chef de cuisine do Brasil no exterior, foram desmentidos. No último ato
do espetáculo, antes de cerrar a cortina, desmentem o dólar, os juros, a
dívida externa e a insegurança que rola nas províncias, estradas,
favelas e becos sem saída. Que causam terror, o verdadeiro terror dos
nossos tempos talibãs.
Estelionato e ruína é do que o eleitor tem
mais medo. Com base no legado que o seu voto acarretou, dado de boa-fé a
administrações eivadas de empáfia que chamavam o aposentado de
vagabundo, para desleixarem na energia que apagou diante de sua visão
julgada ao nível do Primeiro Mundo - a Cinderela dos tecnocratas.
É natural que em gente como a gente com
mais de 50, a descrença se faça presente e se revele em doses cavalares,
na razão direta das vicissitudes já sofridas para se reafirmar no
estrelato nacional e à instabilidade que a vida do artista provoca no
seio do amor, numa relação transparente onde os folguedos da fama não
desvirtuem a verdade que se busca no afeto que encerra o néctar da
felicidade.
Em razão dessa insegurança, na verdade uma
inconstante também na vida dos comuns, é natural o descrédito em abraçar
um candidato com paixão, a traição faz parte da política que, em última
instância, nos representa perante a sociedade. E a nossos sentimentos de
fidelidade.
E se não se apaixona, não se ama, e se não
se ama, a capacidade de crença nos valores de uma sociedade que constrói
uma ética amolece, titubeia e deriva para o medo. O receio em se
apaixonar por alguém ou algo de verdade, que se confundem.
Alarmados, alardeiam o terror do medo nos
olhos de quem os cultua e venera, na esperança de fazer a cabeça dos
“sem medo de ser feliz” e respeitarem a palavra dos mais velhos,
conhecedores profundos de regimes de força que já cercearam sua
liberdade de expressão e não permitiram realizar o que desejaram
outrora.
É coisa de criança, de gente jovem
imatura, de sonho impossível de alcançar, de alternativo errante,
realizar o que sempre desejou. Nem cabe em política tal grau de
fantasia, aferrada que é ao pragmatismo da realidade.
Escolhas revelam paixões, opções
exteriorizam qual é o caminho que escolhemos para definir nosso perfil,
nosso ardor, nosso lema, a nossa cara, uma ideologia pra se viver,
finaliza Cazuza.
Em eleições, ter medo significa dar um
passo com segurança para depois não se arrepender, para que mexer em
time que está ganhando, o pendor monarquista ainda reinante que
pretende-se conferir estabilidade à democracia, quando sua verdadeira
cara é o medo da alternância e a não aceitação de ser apeado do poder,
medidos em perda de prestígio e na arte de manipular o talento com que
Deus nos brindou.
Agimos movidos para escapar do medo, que
nos acompanha desde que abandonamos o útero, apenas para certificar que
a confiança em si mesmo, a fé na missão a que nos destinaram e a
esperança no construir um mundo melhor, se encontram inabaláveis, a
espantar maus-olhados e agnósticos presságios de trevas. É o mínimo que
filhos e netos exigem de pais e avós conseqüentes, não se deve assustar
as crianças com o bicho-papão que lhe espera na próxima esquina, a boa
pedagogia ensina.