NINGUÉM ME AMA
26 de Agosto de 2002
Nora Ney imortalizou ninguém me ama,
ninguém me quer. Em 6 de agosto de 1952, a cantora foi induzida pelo
marido a se suicidar, quase alcançando a morte se não fosse socorrida a
tempo. Era a tal da incompatibilidade de gênios que aflora no seio de
diversas discussões sobre relacionamento que só comprovam não termos
sido feitos um para o outro, haja diferenças que sublinhem as
divergências. Nora Ney passava o dia fora de casa e não cumpria com suas
obrigações de dona de casa, esposa e mãe de dois filhos, que clamavam
por assistência materna, reclamava Cleido. Tem certas coisas que a gente
só diz na hora da raiva, como “a única atitude digna sua seria o
suicídio”. Daí a dar um pulo na farmácia para comprar Alonal e pensar em
obrigar sua mulher a se suicidar, é um salto com vara. Contudo, não
acreditou que a cantora correspondesse à sua provocação e tomasse o
veneno diante de seu olhar hipocritamente incrédulo. Não a abandonou nem
por um minuto na casa de saúde até ela ficar fora de perigo, que susto,
louvado seja Deus!
O maior dilema no casamento é encontrar a
fórmula de seguir vivendo junto depois de finita a euforia e empolgação
dos primeiros beijos, já que manter um relacionamento amoroso estável é,
no mínimo, um excelente tranqüilizante para baixar o nível de depressão
diante do despropósito com que o homem se lança à pescaria. Ninguém, em
sã consciência, admite o fim da paixão, seria abrir as porteiras para a
inevitável separação, qual é o ingênuo e néscio que acredita ser a união
instável uma fase de consolidação a um passo da eternidade?
O tempo de duração de uma paixão depende
da saturação das células que comandam a razão e a lógica, em disputa com
aquelas que dobram nossos joelhos e nos fazem cair de quatro em adoração
à química emocional. O tempo se esgota quando o pobre coitado não
suporta mais a pressão de cobranças e modelos em que se encaixar,
variando de 6 meses a 2 anos para os homens ou de 1 a 4 anos para os
românticos empedernidos. Se por acaso cometerem a loucura de morar sob o
mesmo teto, há quem julgue que não seja por amor, e sim por falta de
bago em começar nova vida e encontrar outra parceira, aquela obviedade
de só enxergar aqueles olhos e mais ninguém não funciona mais.
Há quem acredite que a traição só ocorre
para quem é cego no amor, afinal queimaram-se os sutiãs, a mulher ganhou
a carta de alforria para também trair, e abandonar, e o teste do DNA foi
o tiro de misericórdia no senhor-de-engenho e no seu séqüito de escravas
do desejo. Daí os homens não terem coragem de desistir e partir para um
novo romance, tão óbvio quanto a paixão fulminante. O melhor é
envelhecer ou amadurecer concluindo que exagerou nas expectativas e
perdeu muito em não investir mais na relação, abdicando de coisas como
perdoar os defeitos, para bater o martelo no cocuruto do casamento,
julgando que o fim da paixão mata a pau, até o companheirismo costurado
nas tardes-noites de futebol.
O termômetro para saber se tá tudo terminado com o parceiro anterior é,
se você não fosse você, quais seriam as três coisas que gostaria de ser?
Ser anfíbio, uma nota musical e uma cor, a ter que buscar harmonia e uma
elaboração que fizessem sentido entre eles, para na hora em que o gênio
da lâmpada surgir, poder realizar seus desejos.
Ou ser anfíbio, conquistar um mínimo de
consciência no sonho e realizar-se no amor para resolver seu problema de
auto-estima.