MERO
CONTINUÍSMO
01 de Setembro de 2003
A esquerda brasileira não é mais a
mesma ao se mostrar subserviente a uma política
monetarista de inflação em queda, dólar estável e
recessão, que eleva o desemprego e descumpre a principal
promessa de campanha. Além de tornar permanente o
imposto sobre movimentações financeiras (CPMF) e
desvinculá-lo da área da saúde e do combate à pobreza,
fazendo caixa para o governo. Considera-se normal na
Europa a guinada dos partidos de esquerda rumo ao
centro, quando o seu papel seria promover a distribuição
da riqueza acumulada pelo capitalismo ou, ao menos,
diminuir os seus malefícios naturais.
Se o inexorável domínio do capitalismo contemporâneo não abre
espaço no mundo globalizado para a criação de um Estado
socialista, resta à nova esquerda gerir o capitalismo.
Enquanto existir miséria, desemprego, poluição, buraco
de ozônio, os conceitos de esquerda e direita não podem
ser dados como ultrapassados. A direita ataca defendendo
o combate à pobreza com o crescimento econômico que
aumentará o nível de emprego e o nível de renda. A
esquerda se defende com o Fome Zero que pode descambar
para o assistencialismo.
A verdadeira oposição rejeita o
caminho do mero continuísmo, mas baqueia no projeto de
mudança, se por ruptura ou negociação. Oferecendo a cara
a tapa para processos de expurgo, em favor do
acoplamento do paz e amor petista com a alta plumagem
tucana. Em prosseguimento a um impensável sincretismo
político, ao compartilharem poder e maquiarem o clamor
que veio das urnas com o espetáculo que está por ser
criado.
Se o discurso e a ação são em favor do Brasil, não importa se a
vitória é deste ou daquele partido, somente a democracia
para julgar princípios traídos diante de propostas
edulcoradas. Pois se o voto já desmascarou a
administração anterior, que nos brindou com os dois
piores desempenhos econômicos nos últimos 30 anos. 1999,
o ano da reeleição às custas do engodo da desvalorização
cambial, e 2002, em que 214 das 500 maiores empresas
fecharam balanço no vermelho. Superando, inclusive, o
confisco de Collor em 1991.
Ou será que o povo tem que se ajustar à realidade orçamentária
do governo e refrear os seus desejos legítimos? De crise
em crise na Argentina, o povo acabou justiçando nas
urnas os militares que mataram seus filhos na ditadura,
torturando avós à procura de netos. Com o fim da
anistia, esses senhores provectos dançaram no tango ao
verem quebrada sua espinha dorsal. Indecisos entre se
esconder na Patagônia ou ir para o Além, ciceroneados
por Pinochet.