DNA DA HONESTIDADE
03 de Novembro de 2003
Ethiene, uma cara-de-pau que opera a
sangue-frio. O motivo do assalto foi o dinheiro da venda de uma
propriedade do pai guardado no cofre de casa. Para se defender, a
pré-balzaquiana alegou precisar de tratamento psiquiátrico, mentindo
descaradamente sobre namorar um bandido menor de idade com passagens
pela polícia. Namorou por pena dele e da mãe viverem de
cheque-cidadão. É a primeira vez que programas sociais do governo
servem de álibi. Mesmo sendo ameaçada pelo namorado para consumar o
roubo, continuava sonhando em se casar com ele. Canastrona que só
ela, fez toda uma encenação quando foi encontrada pela polícia,
chegou até a simular um desmaio.
O pai se orgulha da filha criada com o DNA da honestidade, ao
mesmo tempo em que cai na contradição da dor da decepção, maior que
a das facadas. A solução para livrá-la da cadeia é considerá-la
mentalmente insana, condicionada ao aval do Pinel.
Tudo indica que o papel de grande vilão vai
parar nas mãos do namorado. Mais palatável para a sociedade associar
uma ação criminosa e premeditada a um menor com histórico duvidoso.
Afinal, Ethiene possui o DNA que só os filhos das classes média e
alta estão autorizados a possuir. Ninguém a questiona de ter
empurrado o neguinho para o caminho do mal.
Murilo Salles no seu filme “Seja o que Deus quiser” aborda a
mesma questão. A condição de pobre vai empurrá-lo de encontro a uma
punição exemplar para ensinar esses favelados a nunca mais se
meterem com “gente de bem”. O pessoal da comunidade não pensa assim.
Bandida é ela, que planejou tudo. Como pôde fazer isso com os
próprios pais? Aquela carinha de artista não engana a ninguém.
Será que é o amor, mesmo travestido de sexo, sensualidade e
atração fatal, que junta os pedaços da cidade partida de Zuenir
Ventura? Ou é a miscigenação que avança inexoravelmente para se
vingar das macumbas de brancos que jogam água no chope de vitoriosos
no amor? E por que através do trambique, do assalto à imagem de pai
e mãe, desonrando a família como um todo? Será que a estima da
“gente de bem” baixou em função de tanta falta de ética para manter
seus falsos privilégios? Ou será que subiu o elevador da estima dos
renegados à sua própria sorte e começaram a cruzar o Mar Vermelho
rumo à Terra da Promissão?