SEI QUE NADA SEI
10 de Novembro de 2003
A expectativa relacionada ao boom na
geração global de informação girava em torno da produção de novos
conhecimentos, afinal, por conta do nosso imaginário louco, correm
soltas as lendas sobre cérebros, o eletrônico a suprir o humano,
pautado pela capacidade infinita do cérebro de acumular informações.
Quanto mais aprendemos, mais somos capazes de aprender... e a
humanidade acabou engolfada por um oceano de dados, se estressando,
além da imaginação.
A neuro-cientista Suzana Herculano-Houzel lembra que as pessoas
só prestam atenção a uma coisa de cada vez. Para cem janelas abertas
no computador, só uma entra na memória. O eterno conflito entre o
excesso de opções e a chance de encontrar algo que nos interessa.
Entre os zilhões de espermatozóides para fecundar um mísero óvulo. O
fato é que estressa e dificulta a concentração, quando não desvia do
caminho correto a que se propôs.
Para o teórico de comunicação Sócrates Nolasco,
cria-se uma sociedade superficial, em que se estimula a informação
pura e simples, mas se perde a capacidade de argumentar, de
construir idéias novas. O volume de informação disponível não é
garantia de estoque de conhecimento. Donde se deduz que não
necessariamente teremos respostas para as grandes questões.
Como aquele cientista da informática que sempre tirava férias
em Salvador, pois a família de sua mulher era baiana. Detestava
desde o cheiro do acarajé, passando pela cachaça, até chegar no
calor que queimava sua fina pele. A aparência da moqueca não lhe
causava maiores impressões do que sua mala abarrotada de livros...
com cultura e informação. Quando um parente buscava saber o que
tanto lia, mal balbuciava um raciocínio articulado, uma sinopse
elucidativa ou um tema que atraísse o interlocutor. O professor
Pardal deixava uma dúvida no ar quanto ao volume de informações
ingerido não ser garantia de geração de conhecimento. Irrelevante
informar que o casamento não resistiu à ação do tempo.
Como corolário, o refluxo se constata nos encontros e
desencontros amorosos, nas amizades que vão e vêm, nos laços que
fazem e se desfazem, na ternura que se dilui na facilidade com que o
sal se impregna na comida, no efêmero que caracteriza nossas
relações, na fragilidade a que estamos sujeitos nessa ordem
unilateral imposta sob a alegação de que saberão escolher o que é
melhor para nós.
Na ciência, o volume cada vez maior de informação disponível
faz com que os pesquisadores se voltem para áreas específicas de
conhecimento, se especializando. A contrapartida é a extinção
gradual e segura da originalidade do livre pensamento, do que é
singular e peculiar, restando a nós se deliciar com as músicas
faladas de Gabriel, o Pensador.