REI MORTO, REI POSTO
29 de Setembro de 2003
Ao invés de chorar, por que não comemorar
o encerramento da missão de Vieira de Mello na Terra? Foi assim
pensando que Gilberto Gil convocou o secretário-geral Kofi Annan
para, no atabaque, darem um show com “Toda menina baiana” na
assembléia geral da ONU, em memória ao atentado cometido em Bagdá.
Fazendo a platéia sambar, delirar e viver um momento inédito em
ambiente tão formal, um mês depois do desaparecimento do brasileiro.
O Ministro da Cultura promoveu um verdadeiro carnaval, em favor
da paz e da dignidade, brindando o seleto público com “Filhos de
Gandhi”, “No woman no cry” e “Imagine”. E o governo Lula cresceu de
prestígio com a festança. Quem irá agora contestar o nome de
Gilberto Gil como representante máximo da cultura? Não dá para
imaginar o Weffort sambando ao lado de sua namorada Heloísa Severo.
Gil carnavalizou a ONU, por ser brasileiro com muito orgulho e fazer
o Brasil ser levado a sério, com o carnaval como abre-alas da
potência de nossa cultura. Atitude que sempre mereceu reparos da
mentalidade Rui Barbosa remanescente no colunismo político.
Superamos esse estágio, Vieira de Mello bafejou nosso destino.
Claro que a personalidade e a presença física do
ganense Kofi Annan em tudo ajuda e costura algo impensável, se
juntarmos Brasil e África no mesmo barco de levar a cultura o mais
perto de todas a pessoas e através da música lhes dar mais poder. A
ponto de Lula ser indicado ao Prêmio Nobel da Paz diante de tanta
insensibilidade de Bush em favor de guerras para manter a pujança do
império americano. A vantagem do mundo globalizado é que se permite
examinar com mais clareza escrúpulos nas segundas intenções de
governantes preocupados somente com propostas armamentistas e seu
poder de coerção.
Será que Vieira de Mello ficou triste de não poder participar
do arraial armado, ao lado da sua argentina? Ou exultou, porquanto
sua morte inspirou a ONU a continuar na busca pela paz, caminhando
contra o vento, sem lenço nem documento? Ou ficou deprimido com a
heresia da zorra? Da realidade cruel com que a morte nos retira da
ilusão de permanecer desfrutando do grande espetáculo da vida. E de
nos resignarmos com rei morto, rei posto. Se humildes formos. Caso
contrário, a vingança, o inconformismo e o amargor se instalam e aí
principia a morte em vida.