O VOTO DO CRENTE
02 de Agosto de 2004
Nos séculos XIX e XX, tornaram-se notórios
atentados que aniquilaram o czarismo e a aristocracia européia até
eclodir na Primeira e Segunda Guerra Mundial, clamando por uma nova
ordem, se democracia, comunismo ou ditadura populista. Agora retorna
a bandeira do terrorismo, a toda carga. Não há porque lançá-lo na
conta do islamismo se a humanidade já se encaminhava para essa
solução de desafogo. Se o caldeirão já fervia no entorno, por que
não propagá-lo como uma epidemia? Ideólogos que se venderam à
internacionalização da economia julgaram apressadamente que, com o
fim do comunismo, a pobreza iria acabar naturalmente com o
crescimento econômico proporcionado pelo conceito de justiça da
democracia americana.
Um claro exemplo de soberba, como a exploração de candidatos do
status de suprapartidário nas eleições, ao pretenderem não se
misturar com o baixo clero nem se envolver com questões menores como
fidelidade partidária. Se têm vôo próprio, pairam acima do estado,
da cidade e do povo que representam. O partido político é uma mera
barriga de aluguel para serem gestados através de uma vagina que
começa a se prostituir na sagração dos iminentes deputados e
vereadores.
De mesma valência, o crente que substitui o
partido na camisa e na propaganda por Deus, um pecado mortal que
equivale, em seus padrões, a ser condenado aos quintos dos infernos.
Porque pressupõe uma intimidade com a autoridade máxima espiritual,
um acesso que abrirá os arquivos mortos onde contêm chaves que
fornecem as soluções para os intrincados problemas que oprimem a
sociedade. Já faz mais de 100 anos que se fundou o Estado laico,
onde a religião ficou restrita a seu devido espaço, garantida a
liberdade de credo. Se a religião, seja qual for, não dá conta dos
inúmeros problemas decorrentes da evolução da humanidade, imagine
mesclando-se à política. Se corrupção é a associação imediata,
pedofilia é uma assombração que não quer se calar, a ponto de
algumas igrejas de condados americanos acusarem insolvência diante
de indenizações que as faliram.
O avanço do voto do crente e dos seus bispos, em geral. A meta
é alcançar os 20% da população votante, o que corresponderia à mesma
participação dos muçulmanos na sociedade turca, que se pretende
européia. A correlação se traduz no fanatismo: a toda hora você é
abordado na rua por um crente que quer fazer a tua cabeça,
convencendo-a a largar das drogas ou deixar de ser prostituta - seus
parâmetros do Mal. Invadiram os terreiros antes reservados ao
pastoreio da Igreja Católica e, na omissão do poder público,
passaram a desempenhar um trabalho de assistência social que
efetivamente auxiliou e foi de grande préstimo à população desvalida
para, posteriormente, lhe dar frutos: estações de rádio, televisão,
votos, deputados e, agora, o senador Crivella.
Fundamentalista a fé. Fernando Henrique Cardoso perdeu a
prefeitura de São Paulo em 1986 para o histriônico Jânio Quadros
apenas porque pisou na jaca, ao confessar que não acreditava em
Deus. Imperdoável para o povo brasileiro essa confissão de fé.
Apesar do paulistano ser o mais cosmopolita do Brasil. O que não
impediu que, alguns anos depois, FHC se tornasse bi-presidente e
ícone da modernização.
O que é a natureza!, como diria o esquecido comediante Zé
Trindade.