DEPENDÊNCIA DE MUROS
05 de Janeiro de 2004
A invenção do avião tornou obsoletas as
fortalezas. Fulminou-se a obsessão por encerramento, em manter os
forasteiros longe de seus redutos. Muros delineavam os limites do
que era proibido se ver e ouvir tudo que vinha de fora.
Representavam fechamento, inviolabilidade de suas crenças. Se
ampliado o alcance da fé, o escudo protetor de seu mundinho, da sua
unidade, da identificação. Ou você se defendia ou sucumbia, era
certo que alguém iria te matar.
Como o mundo avança retrocedendo, uma nostalgia dos muros se
abateu na 2ª Guerra Mundial com o gueto de Varsóvia, erigido pelos
nazistas. A isolar os judeus, transformando as perseguições
acumuladas ao longo dos séculos num verdadeiro estigma, o holocausto
carimbava em definitivo. Até o espírito de Auschwitz baixar em
Ramallah isolando os palestinos com um muro de 110 km, em resposta
aos homens-bomba trucidando gerações em ônibus, restaurantes e
hotéis. Aumentando o risco-Israel com a perda do capital da
simpatia, da admiração e do respeito que o povo judeu mereceu por
existências sofridas.
Está em jogo a lei das compensações. Se, em nome
dos exterminados e cremados, seus descendentes biológicos têm
direito a uma guerra desproporcional entre judeus e palestinos,
fazendo outros padecerem o preço que eles já pagaram, repetindo os
mesmos excessos, crimes e abusos.
Muros que se foram, muros que ficam, muros que se constroem.
A vulnerabilidade aos invasores estrangeiros - de Gengis-Khan a
Napoleão e Hitler - fez com que a União Soviética erguesse a Cortina
de Ferro através de seus países-satélites, protegendo a fronteira
ocidental, outrora desguarnecida. O Muro de Berlim, o seu maior
símbolo, contra o qual os Estados Unidos bradaram em nome do mundo
livre sem barreiras. Da liberdade de expressão sem censura.
Combatendo o controle da imigração em troca da importação das
cabeças mais brilhantes, a serviço da democracia. Se comunista,
lavagem cerebral através de um bom salário e bens de consumo.
Nem bem terminaram com a maquiagem de Berlim Oriental,
desaparecendo com os vestígios de uma ideologia invertida, a exemplo
do que Israel fez na Palestina ao colonizar a Faixa de Gaza,
bloquearam a fronteira com o México com uma cerca eletrificada. Para
impedir que aumente o já predominante caráter hispânico na população
da Califórnia. Para sufocar eventuais sinais revanchistas quanto à
perda da Califórnia e Texas, através de governos corruptos mexicanos
que os venderam ou retalharam a preço de banana.
A idéia que restou para os Estados Unidos, depois de 11 de
setembro, é de sufocar focos revoltosos de caráter islâmico. E viver
no desfrute de paranóias. A tendência de cercados, fossos,
trincheiras e fortalezas é se transformarem em muro das lamentações,
caso o homem permaneça firme como uma rocha, inflexível, de pé. Como
uma muralha.