LARANJA MECÂNICA
13 de Setembro de 2004
Adolescentes, entre 8 e 17 anos, que
dividem um bueiro na praia de Ipanema, fugidos de casa, onde eram
maltratados pelos pais, com passagens pelos abrigos da prefeitura, ocupam
uma galeria pluvial fechada com barras de ferro chumbadas no cimento. Usam a
própria magreza para se espremerem por uma passagem com pouco mais de um
palmo de largura e ali se refugiarem para assaltar. Cheiram cola antes de
escolher a vítima, com plena consciência de que quem rouba morre cedo. No
bueiro, se protegem dos dias de frio, dos guardas municipais, mendigos,
adultos, das agressões e humilhações dos internatos.
Um país desse tamanho com crianças morando em buracos. Dando
margem aos que “moram bem” manifestar o desejo de jogá-los no mar.
Como em São Paulo, um novo surto de mendigos atacados com um único
golpe de marreta. Um requinte de criminosos extremamente
inteligentes e organizados, a ponto de não usarem armas que deixem
pistas e agindo sem serem notados. Quando não oferecem uma garrafa
de conhaque envenenada com chumbinho, que deixa a vítima paraplégica
ou com problemas neurológicos.
Uma epidemia de execução de moradores de rua
começa a se alastrar: Petrolina, Belo Horizonte, Sorocaba. Matadores
numa campanha de assepsia que se arvoram em decidir o que é melhor
para o Brasil. Nos colocando em xeque, ao agravar o senso de culpa
versus irritação diante do refugo da sociedade confrontado com a
massa de desempregados.
Quando realizado, o filme “Laranja Mecânica” tinha uma
concepção futurista. Que virou realidade em pouco mais de 30 anos. A
ponto de uma organização fascista em São Paulo tornar público seu
ódio aos migrantes nordestinos, responsabilizando-os pelo
crescimento da população de rua. Cheira a preconceito. Uma
declaração do presidente Lula que incomoda.