FAIXA DE GAZA
17 de Maio de 2004
A faixa de Gaza vai de São Cristóvão a
Acari, incluindo a Avenida Brasil e as Linhas Vermelha e Amarela (as
três principais vias de acesso ao Rio), além das favelas do Complexo
da Maré (vizinho do Aeroporto, UFRJ e piscinão) e do Alemão (vizinho
da Fiocruz, do lado oposto). São freqüentes os confrontos entre
policiais e traficantes, numa analogia com israelenses e palestinos.
A invasão de um paiol da Aeronáutica, colado à Maré, dá a dimensão
da geografia e da história da guerra, ao roubarem fuzis HK-33,
modelo considerado pelos especialistas como um dos melhores do mundo
e somente usado por tropas de elite. A cada dia eles nos
surpreendem, parece que foi ontem que encontraram um depósito de
minas terrestres belgas no subúrbio carioca.
Positivamente, não se fazem mais militares como na Redentora de
1964, nos anos de chumbo do AI-5, do “Brasil, ame-o ou deixe-o”. É a
pá de cal nos nostálgicos que clamam por um regime de força para
deter a avassaladora investida desses comandos, alimentados por
suspiros lacerdistas que reivindicam a remoção imediata de favelas,
pautados pelo sucesso estrondoso de “Cidade de Deus”. Ademais, se
Carlos Lacerda fosse um político confiável, os militares o teriam
aproveitado como um ditador civil entre um Castelo Branco e um Costa
e Silva.
O busílis da questão é que hoje não existem mais
comunistas para se perseguir. O buraco é mais embaixo com os
traficantes, um exército que não tem medo de morrer e corrompe a
soldadesca civil ou militar - criaram até um idioma próprio. Não
titubeiam em colocar em risco a vida dos favelados e arrastar a
polícia para esse dilema. O dinheiro é alto e os bacanas bancam. Se
fosse tão fácil parar de consumir, Aids não seria mais problema, ou
sexo não é vício? Perguntem aos fãs da prostituição.
Não temos alternativa. Os militares terão que se despir da
glória a que a farda os remete e se juntar à PM. E se somarem à
Polícia Federal para fiscalizar a fronteira. Formando uma salada de
frutas impensável com a Marinha, vigiando os nossos sete mares e mil
rios. Com que navios, se a batalha é pior do que no Iraque? Mata-se
mais gente e de onde não se espera surgem gatunos, escroques,
malfeitores, fernandinhos, molequinhos, uma pivetada só, que torna o
Estatuto do Idoso uma missão impossível.
Imaginem se tivessem os recursos colocados à disposição pelos
xeiques das arábias na conta do Osama para destruir o mistério das
duas torres. Ia ser um arraso no Rio. Só assim iríamos nos unir,
valeria a pena cantar o hino nacional com a mão no coração como os
jogadores da seleção.
Da Guerra do Paraguai à Intentona Comunista. Estamos em guerra
e ainda esperamos por um inimigo que vá invadir nosso território. O
inimigo é interno, criado por todos nós enquanto pudemos mantê-lo
afastado, na periferia da nossa sociedade de consumo. Armados, usam
a droga como fetiche e fonte de renda para afrontar uma sociedade
que sempre retardou a hora de pôr os pingos nos is. Do ajuste de
contas. De parar de fingir que não é contigo a chacrinha do vizinho
do lado que torra a tua paciência, com essa mania do carioca de ser
espaçoso e fazer questão de compartilhar sua alegria com os outros.
Essa tendência do Rio de muvuca, transformando a faixa de Gaza em
zona.