HIPOCRISIA
23 de Agosto de 2004
Cazuza, Glauber Rocha e Raul Seixas
morreram antes do tempo porque não resistiriam a uma nova investida da
hipocrisia. Glauber não suportaria o povo, depois dos militares em cadeia
culminarem no Sarney, cair no discurso vazio dos marajás que uniu os
descamisados à elite. Com seu discurso tropicalista e cuspindo fogo contra o
imperialismo, não conseguiria explicar um presidente-operário eleito mantendo em
dia suas obrigações com o FMI. Cazuza teria falta de ar de ver tantos amantes de
sua obra quererem meter o dedo no filme que retrata sua vida, levantando a
suspeita de que reivindicam as homenagens de viúvas, tamanho o sucesso que
despertou em sua bissexualidade polígama. Sociedade alternativa como, Seixas, se
a polícia prende quem não tiver aparência de mauricinho e patricinha? Quando não
mata. E olha que a aparência dos gorilas não chega a salvar a pátria.
A ira das encíclicas papais transferiu-se da
terra de ninguém que virou a virgindade para o uso abusivo da pílula
anticoncepcional, que libertou a lascívia e o prazer, acabando por acelerar a
pedofilia que, via internet, associou-se ao turismo sexual com ninfetas e deixou
às claras no que resultou bater de frente com a hipocrisia.
Não é por outra que os crentes, inconformados com o
desregramento da sociedade, se consideram ofendidos pelas paradas gays e
defendem a submissão da mulher perante o homem, conforme cartilhas veiculadas
como material de propaganda nas eleições.
Janis Joplin e Jimi Hendrix também se foram prematuramente. A
angústia, o desespero e a dor presentes nas maravilhosas interpretações de
Joplin anteviam a desmoralização de um presidente americano pelo islamismo. Um
novo capítulo da guerra santa iniciado nas torres que Hendrix preferiu não
assistir. Não se imaginava dentro de um avião a sair no braço com seqüestradores
árabes para impedir que a Casa Branca se transformasse num monturo de entulho.
Considerados doidões suicidas, o que não dizer do sexo oral
que faz a cabeça de Clinton? Do Bush no céu e Osama no inferno? A
insensibilidade de mandar os filhos dos outros para a morte, um general civil
eleito que se encastelou no poder, ungido por uma apuração eleitoral viciada.
John Lennon foi assassinado em meio a surtos que de vez em
quando acometem os Estados Unidos, que não pouparam Reagan, Kennedy ou Abraham
Lincoln. Teve a sorte de ir antes, senão terminaria expulso dos Estados Unidos
como persona non grata por afrontar o puritanismo anglo-saxão que arrota
liberdade de expressão. Um subversivo dos costumes, as drogas eram o de menos,
pois tinha o dom de incomodar o establishment com sua cabeça e alma
privilegiadas a atingir em cheio conservadores que pensam ter descoberto o
elixir da fortuna e que não vale a pena dar um passo à frente, se tudo está
funcionando muito bem - a fórmula de viver mais conveniente. Não toleravam Yoko
Ono a ditar cátedra na copa-e-cozinha da mídia, que entendeu como declaração de
guerra. Um mau exemplo desencaminhador de jovens, pois os afastava dos ideais da
grande América e do patriotismo..
Agora que agüentem Michael Moore com seu "Fahrenheit 11 de
Setembro"! Ou então que o suicidem.