MITOLOGIA BRASILEIRA
30 de Agosto de 2004
Olga está sendo incensada. A mulher de
Prestes se transformou em heroína. Ao ser deportada grávida de sete
meses e embarcada num cargueiro direto para as garras de Hitler. Com
a filha de um brasileiro no ventre. Do brasileiro Cavaleiro da
Esperança que lutou na década de 20 por um país mais justo, livre
das oligarquias decrépitas da República Velha. Seis anos depois,
Olga se tornou mais uma vítima do extermínio nazista.
O peso do caudilho, dentre tantas facetas de Getúlio, sobre as
costas de Olga, sobrecarregando a consciência nacional. O que deu
margem ao aparecimento de caçadoras de outras olgas, que exploram o
filão do anti-semitismo cevado no Holocausto, identificando na Era
Vargas uma política xenófoba que endossou camufladamente atitudes
fascistas.
Getúlio pendurado pelo pé, como Mussolini.
É falso, segundo o historiador Juremir Machado da Silva: não
existia câmara de gás em 1936, o Estado Novo ainda não era realidade
e o Supremo Tribunal avalizou a deportação de Olga, no ápice de uma
época em que política e barbárie andavam de mãos dadas e muitos
confrontos ideológicos se resolviam na base do pelotão de
fuzilamento. Ninguém imaginava ainda o que seria o Holocausto.
O fato é que Olga Benário era uma agente do Partido Comunista
com missão de Stalin para derrubar o governo, o que significaria
paredão para Vargas. Foi escalada para fazer a segurança de Prestes.
Da união em prol dos ideais comunistas, a castidade de Prestes se
foi e nasceu Anita no seio de uma prisão nazista. Arrancada das mãos
da mãe, sofreu sua infância no México até conhecer o pai livre da
solitária que lhe impuseram.
Em plena costura de uma aliança com seu carcereiro em torno de
uma Constituinte para legalizar o Partido Comunista, Prestes chocou
o país com seu pragmatismo. O oposicionista mais ferrenho,
mobilizado em nome dos interesses maiores de seu partido, acabou por
fortalecer a figura máxima do Estado Novo.
Se existe um legendário extenso em torno dos deuses gregos, por
que não começar uma mitologia brasileira? Colocando no altar de um
templo Prestes e Olga, já que nem Getúlio Vargas conseguimos
enterrar. Daqui a 300 anos dirão que é lenda, duvidarão que isso
tudo tenha acontecido de verdade.