PEREBAS
31 de Maio de 2004
Michael Moore levou a Palma de Ouro em
Cannes com “Farenheit 9/11”, documentário que revela relações
pessoais e financeiras dos Bush com a família real da Arábia Saudita
e o clã Bin Laden. Tanto que, mesmo com o espaço aéreo dos EUA
fechado depois dos atentados de 11 de setembro, parentes de Bin
Laden puderam deixar o país sem serem incomodados.
Graças ao apoio entusiástico dos franceses e do presidente do
júri Quentin Tarantino, irmanados na luta contra o american way
of life, o filme pode derrubar o segundo mandato de Bush e
enterrá-lo nos escombros das torres gêmeas. As imagens das torturas
de iraquianos pelo rolo compressor do sistema de carceragem
americano, transmitidas pela engenhoca diabólica do celular, podem
pregar uma lição nos políticos que se julgam acima do bem e do mal.
A sétima arte faria a cabeça dos eleitores.
Numa escala tupiniquim, São Paulo também terá
chance de exorcizar Maluf, o responsável pelas inundações de São
Paulo com suas obras a toque de caixa 2 que resultaram em
contas-fantasma nas Ilhas Jersey ainda não esclarecidas: se titular
ou beneficiário.
O expurgo de Bush vincula-se ao de Maluf na razão direta de
colocar o eleitorado de lá e de cá numa sinuca de bico: está em jogo
sua credibilidade, confiança nos rumos da nação e fé no futuro. A
serviço de quem terão que decidir e, sobretudo, não cair na tentação
de votar em pérolas do quilate de Agnaldo Timóteo, Enéas, Eurico
Miranda e Collor. Não é à toa que aparecem equimoses no rosto de
Bush e Maluf, transparecendo quedas no poder que só fazem crescer a
responsabilidade do voto como arma para cortar a cabeça de quem
promete e, ao chegar no poder, se surpreende com a herança maldita.
Perebas na pele refletem o temor das urnas. Dietas que acabam
em pizza redundam no efeito sanfona e encurtam carreiras políticas.
A governadora Rosângela Rosinha Garotinho Barros Assed Matheus de
Oliveira planeja cumprir o mandato e cuidar dos seus nove filhos,
sempre com a Bíblia na mão. Não suportou a liturgia de compromissos
tão díspares quanto uma cidade alagada seguida de um coquetel de
posse. Não vê a hora de dispensar os terninhos por vestidos, desde
que não sejam transparentes, decotados ou estampados.
Diante desse panorama, não é de todo absurdo que três
adolescentes de classe média em Copacabana estivessem brincando de
tiro ao alvo com uma espingarda de chumbinho e ferido três vizinhos.
Que preferiram considerá-los doentes, merecedores de tratamento e
não de prisão. Ao contrário da mãe de um dos menores, que não quer
deixar o filho impune, vai ter de pagar para enxergar a realidade
como ela é.
Mas, que mal lhe pergunte, como ela é? Basta dar a palavra aos
psicanalistas? Ora, os tiros em Columbine ainda ecoam, Michael Moore
já denunciou. Quentin Tarantino tira tanto proveito da violência em
expansão que ficou com a cara dos cães de aluguel de seu primeiro
filme. As famílias não conseguem estabelecer limites para seus
filhos. Os políticos secam a fonte de nossas ilusões sem o menor
escrúpulo em ver manchado o seu currículo. A impunidade pode gerar
mais violência.