PAGU
06 de Junho de 2005
Patrícia Galvão nasceu de uma tradicional
família paulista. Um dos sonhos da normalista rebelde era conhecer o
Cavaleiro da Esperança, Luís Carlos Prestes. Os caretas da época
detestavam seu linguajar, modo de vestir e suas atitudes
extravagantes. Com seus versos satíricos, deslumbrava pelo seu jeito
atrevido.
O poeta Raul Bopp denominou-a Pagu, apresentando-a para a fina
flor da intelectualidade paulistana. Foi logo apadrinhada por Oswald
de Andrade e sua mulher, Tarsila do Amaral, que a projetaram como a
musa da poesia modernista. Desse convívio nasceu um romance entre
Pagu e Oswald, que abandonou Tarsila, escandalizando a todos com o
novo casamento celebrado defronte ao jazigo da família do escritor.
Em 1931, o
casal fundou o tablóide “O Homem do Povo” que, com suas críticas
irreverentes à moral hipócrita da sociedade paulista, incitou a ira
dos estudantes de Direito do Largo São Francisco - reduto da nata
oligárquica. Empastelaram o jornal a título de estágio comprobatório
para o exercício da profissão.
Pagu participava intensamente da vida política e logo
evoluiu nos quadros da militância do Partido Comunista,
radicalizando de tal forma que conseguiu afastar seu fundador,
Astrogildo Pereira, acusando-o de intelectual. Em 1932, afastou-se
de Oswald e do filho Rudá para levar uma vida proletária no Rio de
Janeiro - família e amor materno, um desvio pequeno-burguês.
Incumbiu-se de missões do PCB, se valendo do sexo para obter
informações do inimigo capitalista.
Em 1935, participou do comício que lembrava a condenação à
morte dos anarquistas Sacco e Vanzetti nos EUA. Tornou-se a primeira
presa política torturada no Brasil. Conseguiu escapar das garras de
Filinto Muller e iniciou uma longa viagem pelo mundo. Circulou por
Hollywood, foi até a China, viajou pela Transiberiana para Moscou e
se decepcionou com o stalinismo. Depois de entrevistar Freud, partiu
para a França, onde fez contato com Sartre, Ionesco e Arrabal.
Ingressou na Juventude Comunista e foi detida numa manifestação de
rua. Não fora a intervenção do embaixador Souza Dantas, teria sido
deportada para a Alemanha, já que sua mãe tinha ascendentes
germânicos.
Retornou ao Brasil em frangalhos. Como resto a pagar da
Intentona, ficou encarcerada até 1940. Lembrou Olga Benário quando
suplicou à sua família para interceder junto a Oswald de Andrade
para que pudesse rever Rudá.
Ressentida com os companheiros e o PCB, vinculou-se ao jornal
“A Vanguarda Socialista”. Seu primeiro artigo foi uma crítica
demolidora ao livro “Vida de Luís Carlos Prestes”, de Jorge Amado.
Posicionou-se contra o chamado teatro esquerdista, só abrindo
exceção para Brecht.
Em 1949, tentou o suicídio com um tiro na cabeça. O crítico
literário Geraldo Ferraz já era seu companheiro e assim continuou
até o fim de seus dias. Em 1950, não se elegeu para a Assembléia
Legislativa de São Paulo pelo PSB e encerrou seu ativismo político.
Após anos de exercício como agente cultural em Santos, contraiu um
câncer e quis morrer no estrangeiro, distante da Pagu que virou um
mito. Outro ensaio de suicídio e o retorno ao Brasil para morrer
junto à família em 1962.
Moral da história: assim como o Partido Comunista não pode
confiar na conversão de qualquer burguês à causa, devido ao
insurgente não conseguir abrir mão de suas posses, o amor livre está
sujeito aos mesmos abalos. Sucumbe à lenda envolto em canalhices
sexuais em nome da liberdade para romper as cadeias da família e
colide com a imensidade da oferta que propicia o amor. De tão
genuíno e singular que se pretende exclusivo.