ELASTICIDADE MORAL
04 de Setembro de 2006
“Ele não está preparado.” É o veredicto
dos que ganham acima de 10 salários mínimos para não votar no Lula.
Acusam-no de ser chegado a uma branquinha, não cultivar as boas letras e
ter uma língua solta que envergonha as distintas famílias dos
apologistas de uma ética imune a truques e malabarismos. Quando ética só
existe uma, que é a de não roubar, principalmente em se tratando de
dinheiro do contribuinte.
Por que então não conseguiram derrubar Lula? No regime
parlamentarista, o mensalão obrigaria à convocação de novas eleições
para o povo ser consultado quanto à sua permanência no poder. Não
necessitando de sanguessugas absolvendo mensaleiros. Mostrando a
verdadeira dimensão da banda podre do Congresso quando obrigados a dar a
cara a tapa pelo detetive Gabeira, que se despiu da postura zen ao
perder a paciência com Severino, para ser parasitologista no exame da
merda da política.
Por que Lula não perdeu apoio nas classes de
renda mais baixa? Embora, a grosso modo, soubesse do mensalão. A
aprovação ao seu governo aumenta com o usufruto do Bolsa-Família. Seria
um troca-troca que surtiu efeito? Ou será a última vez que a burguesia
vai permitir um candidato com a cara e o perfil de Lula? Se esquecem de
que mais de 120 milhões de eleitores enterraram os formadores de opinião
e dispensam a alcunha de ignorante atribuída por brasilianistas pornôs.
É muita tucanagem Alckmin não explorar as imagens do julgamento
e cassação de Zé Dirceu no confronto com Lula, nem explicar
didaticamente, com linguagem de médico, que mensalão é a compra de um
poder pelo outro. Tem de bater para provar que não é igual. E o que
dizer de Tasso Jereissati, que trai os tucanos na sua terra natal ao
apoiar Ciro Gomes? E Cesar Maia, que não encarou as eleições para não
ter que explicar o desprezo à saúde do Rio de Janeiro, preferindo ser
comentarista de blog? Soa vago o discurso de choque de competência de
políticos que almejam se travestir de empresários bem-sucedidos. Basta
nos lembrarmos da era FHC, profícua em privatizações jamais investigadas
e com procurador da República esfalfado de engavetar processos contra o
presidente.
É um Brasil mais real deixar aflorar todos esses escândalos do
que esconder a sujeira debaixo do tapete. Já que a cidade de Deus tomou
conta da locomotiva São Paulo. Não há que censurar o filme da ginástica
de Lula para ganhar as eleições, dividido entre o pastor Crivella e o
ex-radical Vladimir Palmeira transformado em um bonachão animador de
festas. De mais quantas campanhas eleitorais Heloísa Helena precisará
para se decidir entre governar e seguir o programa do partido? Melhor
deixar a consciência ficar sobressaltada do que alienada.
Então, vamos combinar: ética tem mais de uma.