VOTO EM CAUSA PRÓPRIA
30 de Outubro de 2006
Não se pode dizer que o povo brasileiro
deixe de esgotar todas as tentativas para eleger um presidente, desde a
redemocratização. Uma aliança inacreditável de pobres e ricos apostou
todas as fichas num caçador de marajás, que retribuiu com o confisco da
poupança. O impeachment de Collor envergonhou o eleitor, que ungiu nas
urnas um pavão cuja plumagem prometia, com a privatização, o ingresso do
Brasil no Primeiro Mundo. Devolveu-nos um país endividado sem que a má
gestão tivesse sido investigada. O povo titubeou entre Roseana Sarney e
Cyro Gomes até que tomou coragem e finalmente escolheu um dos seus.
Gostou tanto que repetiu a dose, fazendo ouvidos moucos a dossiês e
mensalões. Não enxergaram nos outros candidatos maior honradez. Ou
levaram mais fé na palavra de Lula. Mais vale o certo do que o duvidoso.
Mais vale um torneiro mecânico na mão do que um gomalinado voando.
Sabe-se lá se vai surgir uma outra oportunidade igual a essa. Não apraz
à burguesia permitir o ingresso de convidados desse jaez na festa da
democracia. A não ser que o imenso contingente de excluídos se organize.
Faltava Lula comparecer aos debates, ainda mais quando surgiu o dossiê,
o povo não gosta de votar num candidato que se esconde. Ao dar a cara a
tapa, Alckmin se serviu. Foi a sopa no mel para Lula deitar e rolar nas
privatizações, pegando uma carona na Regina Duarte para explorar o medo
de um privatista ensandecido como Alckmin, que precisou vestir a camisa
e botar o boné do Banco do Brasil, da Caixa Econômica e da Petrobras e
renegar seu passado. O terceiro turno só interessa aos perdedores -
Tasso e o PFL de Bornhausen, ACM, Cesar Maia. Quem terá a audácia de
tirar do poder 58 milhões de eleitores? Ganhando a fama de golpista e de
sabotar o Brasil? Serra e Aécio é que não, de olho em 2010, quando, sem
Lula, se comerão. Depois que consentiram em oferecer Alckmin, em
sacrifício próprio, aos eleitores que clamavam por ética, reconhecendo
que não dava para encarar Lula no resgate da auto-estima dos pobres.
Deixando os antilulistas sem pai nem mãe com um candidato com cara de
cliente especial de banco, desesperados para cravar ladrão no peito de
Lula. Ainda mais que a grande maioria dos carrascos que comandaram as
CPI que pretendiam ir ao fim do mundo dos estertores petistas não se
elegeram - a maldição de Lula. Os preconceitos contra Lula, que tanto
divertiram os internautas, explorando a cachaça, a falta de cultura, o
turista do Terceiro Mundo, o salto alto, o messianismo, o último a
saber, acabaram por se reverter em favor dele. O fragor da humilhação
atingiu o povo, que relativizou os desvios éticos e votou em sua própria
causa.