BERGMAN MORRE E DEIXA
COMO LEGADO SUA CABEÇA
06
de Agosto de 2007
Títulos de filmes que
marcaram época e se incorporaram ao idioma
português. O ovo da serpente, a personificação do
nazismo; persona, o Bergman autodidata em
psicanálise; gritos e sussurros, o mestre da alma
feminina; cenas de um casamento, responsável por
incrementar separações não só na Suécia, como no
restante do público mais intelectualizado espalhado
pelo mundo, que confundia os nórdicos com nível de
evolução superior, enquanto a picardia italiana
associava a amor livre e turismo sexual em
Estocolmo.
A geração nascida no
pós-guerra passou a se deter na profundeza da alma,
sem Deus por perto. Não queriam herdar o papel
legado pelo pai e pela mãe, tamanha a incongruência,
inadequação, desconexão, o absurdo da vida a dois,
com as convenções sociais perdendo força ao passo
que crescia a agonia diante da existência. A chegada
da Morte no sétimo selo e se dar conta de que nunca
mais verá os seus de novo. Nos morangos silvestres,
o velho vê a sua hora passar no rodopiar dos
ponteiros do relógio e não pode deter o inexorável
fim de seu tempo.
Instigado por um severo
regime disciplinar protestante, Ingmar Bergman
trabalhou no cinema a cabeça - o subtexto -, em
oposição ao pai pastor, à semelhança da criação e
formação de Jung, que encurtou a distância entre o
consciente e o inconsciente. O que irritou os
apologistas do entretenimento na sétima arte e de
Hollywood nas paradas, por se sentirem
marginalizados ao acharem seus filmes chatíssimos -
era constrangedor sair do cinema e admitir que não
entendeu nada. Mal sabiam eles que, de uma forma ou
de outra, iriam parar no divã, senão no Pinel, pois
Bergman, na sua preocupação com a inquietude da
experiência do sujeito com o inconsciente, atraiu
Freud para a psicanálise bergmaniana. O sujeito ia
assistir ao Ingmar, se reconhecia neurótico e pum!,
direto pro consultório. Foi assim com Woody Allen,
que agradeceu ao maior artista do cinema desde a
invenção da câmera cinematográfica - no gênio em que
também se tornou.
Quem, no século XX, que,
sem ser Freud, teve a capacidade de detonar tantos
casamentos e mandar para o analista um séqüito
enorme influenciado pelo intelecto privilegiado de
Ingmar Bergman?
Difícil uma
extraordinária capacidade intelectual chegar a ser o
mais popular e o mais querido, pois se requer um
tempo para assimilá-lo, ainda mais por terem escrito
e filmado o cerco ao ser humano, castigado pela
angústia existencial que o remetia à solidão e à
aridez. Pela incomunicabilidade, especialmente entre
casais, o tédio e o silêncio do cinema de
Michelangelo Antonioni, a traduzir o impasse nas
relações humanas.
Nenhuma relação acaba,
segundo Antonioni. Morreram vocês, logo no mesmo
dia, para provar que não foi um eclipse o legado de
suas obras.