Coleção "Rússia de todos os Czares" - Fascículo 04
CATARINA DA RÚSSIA
A princesa Catarina não era russa e nem se
chamava Catarina ao ascender ao trono da Rússia, resultado de um vácuo no poder
em que a coroa passou por diversas mãos até cair no colo de Pierre de Holstein -
Pedro foi tão Grande que não deixou sucessor. Ao casar-se com o sobrinho-neto de
Pedro para freqüentar a corte russa, a Cinderela abandonou seu reino de “eu sou
pobre, pobre, pobre, de marré, marré, marré, de si”, converteu-se à lei ortodoxa
e aprendeu sua nova língua e tudo que concernia à Rússia.
Mal adivinhando que um dia iria alcançar
um grande relevo de 1762 a 1796, ao dirigir a política expansionista da
Rússia, conquistando a Criméia, Lituânia e Ucrânia, compartilhando a
Polônia, guerreando a Turquia e explorando o estreito de Bering para
caçadores russos se instalarem no Alasca em 1784.
É a doutrina do imperialismo, defende os
interesses imperiais na aquisição territorial para fundar
estabelecimentos e criar colônias, ou manter Estados sob sua proteção -
que procuram disfarçar a submissão econômica, política e cultural -,
estendendo seus domínios e autoridade a terras estrangeiras. A seu
favor, a virgindade da Sibéria e da costa oeste americana. Contra, o
pretexto de saídas para o mar na medida em que se expandia, afinal, a
Inglaterra, rainha dos sete mares, já farejava a China.
Dotada de uma vontade de ferro e de uma
energia sem limites, sua inteligência não tardou a se destacar de seu
consorte, que bebia muito e mostrava que não tinha estofo para
acompanhar sua rainha. Seis meses após a subida ao trono, Catarina o
depôs com um golpe de estado e se fez nomear imperatriz da Rússia. Dez
dias depois, o marido foi oportunamente assassinado no curso de uma
briga de beberrões. Obra e arte de Grigori Orlov, esperto oficial da
guarda do palácio, um dos amantes de maior prestígio da coleção
memorável de Catarina, que recebeu o seguinte bilhete: “Dama soberana,
ele não existe mais, o mal foi feito, mãezinha”.
Com 20 primaveras apenas, não se preocupava
em esconder suas ligações que não eram perigosas nem extraconjugais.
Mandou ajustar o uniforme da guarda para examinar com maior nitidez e
clareza de propósitos o tamanho do membro de cada oficial. Sem ser
bonita, ela possuía magnetismo, vitalidade e poder para abrir seu desejo
e estimular o pretendente a desvendar seu mistério. Seus favoritos não
tinham do que se lastimar. Ela casou-se com um deles, Stanislas
Poniatowski, titular do trono da Polônia.
Ávida de poder, amava o aparato do qual se
cercava ao colecionar coches. Para a sua coroação, encomendou uma coroa
com 5 mil diamantes, 76 pérolas perfeitamente combinadas e um rubi de
399 quilates que pertenceu ao imperador da China. Tornada a coroa
oficial para todas as cerimônias de coroações que se seguiram, era tão
pesada que seus sucessores queixavam-se de dores na cabeça.
Não há como comparar os tesouros do czar
com as jóias da rainha da Inglaterra, mesmo porque na guerra civil de
1642 que culminou na proclamação da República em 1649, Cromwell fora
compelido a obter liquidez de todo o ouro com que o reino se banhava,
para armar-se até os dentes na modernização de um absolutismo atrelado a
uma gestão semifeudal na economia. O ouro agora viria do mar,
importações somente a cargo da frota britânica, é através do comércio
exterior que se travariam as futuras guerras de conquista de mercado.
Como num complicado jogo de xadrez, avançaram a rainha para propiciar o
xeque-mate em futuras colônias à mercê de uma pirataria que evoluía e se
sofisticava.
Uma fortuna incalculável consumida em seus
palácios e casas de campo fez de São Petersburgo uma imponente cidade,
onde as casas em granito substituíram as primeiras casas de madeira.
Catarina ampliou e embelezou, com o apoio de arquitetos estrangeiros, o
Palácio do Inverno, surgindo a galeria Hermitage para alojar sua
biblioteca e coleção de quadros, composta das mais belas peças que seus
emissários traziam do estrangeiro. Cedo ela juntou 4 mil dentre os
maiores pintores da Europa, como Rembrandt, Raphael, Van Dyck e Rubens.
Mandou recolher todos os ícones de Rublev, desvalorizados e
deteriorados, que se espalharam pelas casas de camponeses a enfeitar o
lugar de patriarcas em mesa de refeições - lugar de honra cedido a
estrangeiros ou idosos em visita.
Catarina se considerava herdeira
espiritual de Pedro, o Grande, e se sentia responsável pela obra que
havia criado. Culta, movida a paixões e ambições desmedidas, a déspota
esclarecida foi a introdutora do feminismo na Rússia, do ponto de vista
do exercício do livre jogo do sexo, a despeito do estado de czarina
constranger e levá-la às últimas conseqüências na questão de diante de
tanto poder o que fazer para se satisfazer. Perturbando as mulheres
cansadas de serem satélites dos homens e que ganharam luz própria.
Esta intelectual possuíra uma cabeça
reconhecida por ela mais masculina que feminina. Fascinada pela
filosofia do Iluminismo, Voltaire e Diderot exerceram influência na
corte com sua presença, em como o monarca governar conforme as
exigências da razão e não segundo a vontade de Deus. Na regeneração da
bondade no ser humano, em contrário senso à concepção da Igreja do homem
pecador na essência. Teriam direitos naturais ao que os governos não
poderiam escarnecer. Em pleno século XVIII, onde a servidão na Rússia
estava longe de ser um veio exaurido a caminho da extinção, como no
restante da Europa.
Os czares se encarregavam de perpetuar a
servidão, ao recompensar àqueles que os serviram de forma exemplar,
dando-lhes terras, incluindo todos os camponeses a ela vinculados. O
prêmio ao servilismo como garantia de fidelidade e eternização dos
privilégios imperiais. Todavia, muitos ainda viviam em condições que
nada diferençava da escravatura. Conta-se que uma dama da corte encerrou
seu cabeleireiro numa gaiola, a fim de que ele não abrisse a boca sobre
sua calvície. Untavam as vastas cabeleiras para reter piolhos no
pegajoso da gosma, e somente servos para recolhê-los.
Uma situação asquerosamente insuportável
que levou cossacos, rudes guardiães das fronteiras do império, a se
juntarem a outros dissidentes - servos, mineiros, monges e exilados
políticos - e exigirem terras em revolta camponesa nos confins do Ural.
Tiveram a veleidade de marchar contra o governo de São Petersburgo,
aproveitando que as tropas imperiais estavam entretidas com a guerra
russo-turca na Criméia. Catarina acerta apressadamente a paz com a
Turquia, persegue-os, promove enforcamentos em todos os recantos que
apoiaram a insurreição e abandona seus pruridos intelectuais ao
interditar Voltaire.
Na sua escala de preferências, os amantes
mais jovens começaram a ser contemplados. Se enrabicha pelo mais notável
de todos, Grigori Potemkin. Um oficial da guarda, bem nascido, que
distribuía diamantes às damas em recepções, cuja admiração ia desde o
seu conhecimento do grego, latim, francês e alemão, até a imprudência de
imitar sua pronúncia alemã, correspondida com o chamego de um “meu
pavão”, “meu cossaco”, meu “faisão dourado”.
Potemkin se tornou o conselheiro mais
ouvido, mesmo quando o ardor de sua paixão esfriou. Foi o artesão do
reatamento da Criméia com a Rússia em 1783, importante para conseguir
uma saída marítima através do Mar Negro. Catarina não se fazia de
rogada, dispunha dele como o melhor amigo a ponto de escolher os seus
amantes, retribuindo com a construção de um magnífico palácio em sua
homenagem.
Quando Potemkin assentou portos e preparou
uma frota para explorar o Mar Negro, reacendeu o estado de beligerância
com a Turquia ao ameaçar a hegemonia otomana. A proposta expansionista
prosseguiria com o czar Alexandre I, que anexou a Geórgia e a Finlândia,
construiu fortes no Alasca e se estabeleceu na costa oeste da América
até a Califórnia.
Ao morrer, Catarina legou um país de
fronteiras mais amplas, exaurido por conta de suas extravagâncias com o
recorde impressionante de 137 amantes, fora os que saltaram pela janela.
Insatisfeita com os amantes, providenciou uma égua empalhada para que
ela se enfiasse e atraísse cavalos trazidos pela guarda. Ao se mexer na
posição adequada, fornicavam com ela. Tanto fez que acabou morrendo
rasgada por um colossal membro. Como não podia deixar de ser, gerou
herdeiros bastardos como Paulo, que governou 4 anos, 4 meses, 4 dias e
morreu aos 44 anos.
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