EM NOME DO PAI, DO
FILHO, DO ESPÍRITO SANTO
11 de Abril de 2005
O modelo de mulher adotado na cultura
cristã procurava encaixá-la na Virgem Maria. Sem pecado e submissa
ao destino, de infinita bondade e compreensão. Ultrapassado.
A declarar que os homens não sabem o que fazem, só resta
perdoá-los, já que fomos concebidos à imagem e semelhança do Pai
eterno. Validade vencida, pois nem ruindo seu pátrio poder abdicaram
da coragem que se julgam investidos para, ainda, se identificarem
com super-heróis dos quadrinhos.
Segundo os
livros sagrados escritos por apóstolos em uma linguagem patriarcal,
em que abundam violência e vingança implacável, num universo
tipicamente masculino de Pai, Filho e Espírito Santo. Falta-nos
descobrir por qual porta entrar na Bíblia para encontrar a paz, que
também se tornou uma guerra em busca de amor, sexo e amizade no
lugar de Pai, Filho e Espírito Santo. Porém, um certo gosto de
sangue na boca insiste em não nos abandonar, o que equivale a não
querer ficar para trás um do outro e dificulta os relacionamentos,
mais competitivos do que nos tempos de antanho.
São invasões de privacidade sem hora marcada e batalhas sem
fronteiras, num terreno sem dono, com julgamentos cruéis e sem
compaixão. Os homens na sua eterna vontade de serem perfeitos,
divinos e justos para serem absolvidos da enorme culpa que carregam
por conta de traições e graves conseqüências. Quantas travessias
para não alcançar terras proibidas e territórios sagrados.
O homem como centro das atenções, o único, o grande
imperador, a eterna figura do Pai, passando o bastão para o Filho,
ambos dispostos num grandioso altar. Acima do Bem e do Mal, as
demonstrações de força bruta, um atributo exclusivo dos homens,
mistificado por uma consciência crítica que não se descobre quando
matam uns aos outros.
Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, o homem se
encontra dividido. Entre se exercer na ética ou no prazer. Entre
lavrar a colheita com tamanha simetria e regularidade que se torna
monótono, e não degustar do prazer diante do inexorável caminhar
para a morte. Ele precisa do balizamento, do farol que ilumina o
horizonte e do porto seguro, pois não está preparado para lidar com
perdas e frustrações, muito menos para a extinção do objeto de seus
escravizantes desejos.
Por isso, soa como uma ameaça, uma assombração, quando a mulher
resolve desenrolar suas tentações, obsessões e desejos
inconfessáveis, enfim, desvelar seu mistério. Ele interpreta como
uma pedreira maior que a sua para desbastar. Não suportaria viver ao
lado de alguém com tamanho complexo em verbalizar ao cubo
intimidades que não caem bem numa mulher de nível, ao seu feitio.
Não decifraria nem seria de seu agrado, além de inferiorizá-lo e
porventura colocá-lo face a face com um rival que abra seus olhos
para essa mulher interessante e atraente que nunca enxergou.
Ele não agüentaria ela contar porque se deixou enlaçar por
aquele tipinho que não dormia sem estar emaranhado em seus braços e
pernas e que a beijava sugando-lhe toda a sua alma para misturá-la
ao seu eu. Ele não suportaria atestar o olhar dela desviado para
quem conseguiu penetrar em sua anima. Não foram apenas as roupas
largonas que quebraram o seu formalismo: ela exalava um ar desperto
que despachou para bem longe a songamonguice necessária para se
encaixar na educação recebida de seus pais. Isso o assusta, a
faculdade adquirida dela se deslocar sem maiores embaraços e alterar
a marcha dos acontecimentos sem depender de consulta prévia. Se
considera demitido do lugar de consultor, conselheiro e sábio.
Perdeu a ascendência sobre quem nutria uma fixação, uma fé cega, o
deslumbramento que caracteriza o grude. Também pudera, tão logo se
despediam, ela sentia saudades na primeira esquina.
Orgulha-se de não se enganar com o sorriso feliz dela, apesar
de tentar depreciá-la. Em vão. E se socorre na masturbação. Um vício
que derivou da adolescência para interromper o coito antes da
ejaculação. Preventivamente, para evitar surpresas. Os filhos
abortados antes da concepção agradecem tamanho sacrifício.