O POIA
16 de Maio de 2005
Poia é um termo que caiu em desuso e serve
para designar a pessoa preguiçosa. Estaciona num lugar e não tem
coragem de levantar-se para coisa alguma. Incapaz de se mexer para
ajudar quem quer que seja, pois não faz nada nem por si mesmo. Não
quer nada com a hora do Brasil. Só de falar em trabalho, cansa.
Deprecia os que labutam. Quer que tudo chegue às suas mãos sem o
mínimo esforço. Não esquenta, justamente para dar um tempo, refletir
e não tomar nenhuma atitude. Acorda tão tarde que perde a hora de ir
para a praia e resolve parar no bar para pôr as idéias em ordem.
Como se fosse possível.
Quando a virgindade pesava na assinatura dos contratos de
casamento, não achava nada demais os sicilianos recomendarem aos
recém-casados exibirem o lençol manchado de sangue. Reflexo de uma
cultura machista que não deixava por menos, tinha de engravidar logo
no primeiro dia, evoluindo depois para “cavalo amarrado ainda
pasta”. A celebração da sociedade do poia com o vampiro.
Useiro e
vezeiro em trocar idéias com esposas insatisfeitas de amigos do
peito - o pecado sempre mora ao lado -, cujo percurso marcado por
infidelidades conhecia. Para pegar as sobras de mulheres que
transferem a culpa de serem obrigadas a trair para o sexo oposto.
Por vingança, que se iniciou na falta de atenção e riscou o fósforo
quando o olho guloso do marido despiu da cabeça aos pés a amiga que
veio de longe - o mesmo olhar que a conquistou. Ela agora necessita
de uma assistência social sem que o poia levante um dedo sequer,
bastando uma voz aveludada como máscara para ele se servir dela.
O poia não casa porque é complicado o negócio do casamento,
discutir relação apenas como estratégia de abordagem, relacionamento
passa ao largo de seu dicionário, amante é o caso. Os casos que
sustentam o cacho de penduricalhos que enfeitam seu orgulho e não
criam raízes. Afinal de contas, é do tempo das marchinhas de
carnaval de João de Barro, “Yes, nós temos banana, banana pra dar e
vender... banana engorda e faz crescer".
O poia aluga uma garçonnière, mas não abre mão da mãe, vai
que se dá mal com esse mulherio. Seguro morreu de velho. Embora
devagar quase parando, não dá pérolas aos porcos, tem que
transparecer que é esperto. E viril, mesmo assim somente quando
necessário, para não cansar. Escondendo seu rotundo fracasso de não
haver sido o que nunca sequer suspeitou que pudesse vir a ser - vai
morrer abraçado a essa causa infecta.
Não moveu o rabo um centímetro do ponto de partida, desde
que se entende como gente - sua maioridade foi retardada. Dá volta,
dá volta, e não sai do lugar, pior, se orgulha de seu descortino,
quando sua mente se afina com a discriminação e desprezo aos pobres
mortais.
Conservador ao extremo, o bofe tem a audácia de se considerar
desadaptado à realidade, não merecedor do que as mulheres lhe
reservam, a ponto de perder a cabeça e se socorrer no michê - opção
responsável pelo incremento da hepatite C.
O poia se torna estúpido ao levar ao pé da letra a pose
inconformista de não conseguir enquadrar-se em nada. Cogita se munir
de antidepressivos para anular seu espírito crítico, afinal monta
verdades que não se mantêm de pé. Verga sob o peso do esnobismo de
que tudo ao seu redor não presta, suando em bicas, porque o deixa a
um passo do cadafalso.
Brinca de anarquismo, uma ideologia que não se sustenta por não
almejar o poder, é só desconstruir, demolir, arrasar quarteirão,
assistir a ruína das instituições e a moral ao avesso, bastar-se nos
escombros - o retrato fiel de seu lar como um templo em que se
refugia de todos.
Na hora de ir para a cama com uma mulher, ele se deita primeiro
e espera que ela se dispa, apreciando a vista. Explorando pudor,
adequação da plástica ao perfil e sofreguidão pré-sexual, quando ela
se desarma. Possui o dom de atrair parceiras que o deglutem, ao se
colocar à mercê de disparates em nome do sexo... o poia é mesmo uma
piada!
Prefere dar as costas na hora de dormir, não consegue dormir de
frente, sequer grudado ou com as pernas entrelaçadas. Casando-se,
quartos ou, no mínimo, camas separadas. Refletindo a fobia do mais
perto se transformar em perto demais. Melhor cortar o momento mais
esperado no sexo: o relaxamento da entrega. E enfrentar a
insegurança da noite e recolher-se aos costumes de sua cela.