ABRIR OU FECHAR?
02 de Abril de 2007
Conservar-se vivo dentro de seu próprio
mundo e de costas para qualquer coisa que venha de fora. Abrir e fechar,
ou seja, fechar quando se alcança um grau de poder de se dar ao luxo de
escolher o destino que rege sua conduta, sem que ninguém dê palpite
sobre o que há por ser feito, sem precisar de quaisquer agentes externos
para dirigir ou suprir sua vida, e se considerar o centro do mundo. E
abrir, quando se chega à conclusão tardia de que fechar questão é um
grande equívoco, ignorando que está para nascer quem possa prescindir da
livre negociação de comprar e vender idéias. Se o que eu tenho é o que
você precisa, a troca não garante a satisfação, mas cria a ilusão de
valer a pena arriscar de novo, uma promiscuidade que vicia e exige exame
periódico da virtude e da ética, de modo a não permitir que a luz do sol
o cegue. O caráter moral demanda esculpi-lo sob a ação do tempo, viver
fechado poria fim à própria existência.
Eis o dilema hamletiano: abrir ou fechar? Se traçarmos um
paralelo com nossas vidas particulares, ora a gente deseja se manter em
casa, resguardado por uma mata cerrada, no tempo das cavernas como um
eremita, sem absolutamente ninguém incomodar, não sujeito ou disponível
a ser invadido por questionamentos, convites pueris e esbarrões
fortuitos. Você sente que não captam o sentido de suas palavras, forçoso
um basta para saber o que há por detrás do murmúrio e por baixo do pano.
Porque estamos em litígio com o oriente próximo, médio e extremo - onde
o sol nasce.
Ora a gente precisa pôr violetas na janela, se
abrir como uma flor em botão, ver o que há de novo, sair da toca, correr
atrás, participar. Desabotoar a camisa, mostrar-se expansivo e abrir o
peito, para tornar a se envolver e trocar juras de amor, fazendo as
pazes com os ilustres desconhecidos que elegeu como bodes expiatórios.
Nessas ocasiões, embora não peça para ser convidado, implora para que
alguém o acompanhe, pois não sabe fazer mais nada sozinho.
É de bom alvitre que estejamos antenados para acolher estímulos
que vêm do céu, pois é aqui na terra que essa energia se materializa e
cria, valendo-se de tendências mutantes que ressoam além do eco, já que
tudo se desenvolve, ramifica e se consolida na busca do paraíso etéreo,
robustecendo tanto que pode passar do ponto e cair na rigidez que
acarreta o inevitável declínio.
Se tentarmos ir num pé e voltar no outro, encontraremos a chave
que correlaciona o movimento de abre-e-fecha com mudança e permanência,
respectivamente. A pedrinha no sapato te obriga a se mexer, a tirar o
rabo do assento, a mudar para onde todos apontam em contrário, e
acreditar no sonho do vagabundo chapliniano. A busca pela permanência é
uma questão de ordem da espiritualidade, pois os grãos de areia escoam
pela ampulheta enquanto o gênio da lâmpada mantém-se vivo engarrafado, a
postos para realizar seus desejos, se estiver familiarizado e à vontade
com os espíritos que aqui permanecem e nos volteiam.
Ninguém contesta que abrir só faz sentido se for para mudar,
bem como fechar se relaciona a querer manter-se a todo custo onde se
encontra, agarrado ao exército da salvação, permanecendo inflexível no
posicionamento. Mas permanência não é só apego desusado ou disfarçado,
traduz também seu espírito no construir de uma vida terrena em torno de
crenças e ideologias a favor de mudanças. Nem abrir representa
instabilidade porque brotado do espontâneo, justamente quando o que
deseja é abrir a mente na maior boa-fé, sem reservas. Nem representa
convite à invasão, sujeita a litígio por fronteiras sempre difíceis de
serem demarcadas, tais quais separar ficção de realidade, joio do trigo,
goiabada do queijo, joão de maria.
Em se plantando tudo nasce, cresce, dá frutos, a natureza seca,
inunda, destrói, transforma em pó o que o homem plantou, e o desafia a
plantar de novo. São partes de um todo que podem se encaixar no eixo do
movimento entre dois pólos: mudança versus permanência.