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MÁSCARAS E MASCARADOS

Descubra quem são seus pares e devote aos outros sua face oculta que nem você sabe qual delas é mesma.
O primeiro encontro foi num baile de máscaras, a rigor, em pleno inverno. Ele, bêbado sem deixar rastros, apenas acusando sinais de amargura e descrédito, remanescentes de amores ao léu de fantasias. O olhar de desdém iluminou-se ao mirar o delicioso colo nu e branco, dela, que tiritava de frio sob o manto da discrição, a ocultar a beleza da professorinha prenhe de princípios e idéias preconcebidas, avessa a homens alcoolizados.
Um luar astrologicamente favorável os fez dançar a noite inteira juntos, mal contendo a impetuosidade romântica que iria encharcar o leito de amor de duas personalidades antagônicas que teimaram em não se aceitar. Ela, a querer enquadrá-lo em seu modelo de homem. Ele, debochando de sua formação conservadora em conluio com a avidez por transformações radicais na sociedade.
Ao começarem a privar da intimidade um do outro e a desvelar segredos de amor hermeticamente encerrados, a lua de fel ilumina um campo fértil para aflorar cenas explícitas de posse, entre urros lancinantes que anunciavam os próximos orgasmos, destemperados pela intolerância que acabou por colocá-los em trincheiras opostas.
Por entre as alfinetadas disparadas, ele é atingido por um dardo vindo de outra mulher. O arco ainda retesado era empunhado por Cupido, furioso com essa disputa que intranqüilizava seu reino.
Ela resolve encarar os deuses e preparar o bote da serpente de Eva. Fantasiou-se de Clóvis no carnaval, um palhaço estilizado, primo da burca, medievalmente coberto da cabeça aos pés de preto, complementado por uma máscara de resguardo do rosto em esgrima, estampando uma caveira, e um balão de bexiga, com que se bate no chão e assusta as crianças.
Feio que dói, ele havia atarraxado uma máscara que o tornou formoso perante as mulheres e másculo aos homens, comprovando que feiúra é pros que não têm identidade que delineie a fisionomia.
Em plena avenida, ela o espeta com a unha afiada e espanca a bexiga no asfalto, ignorando o avião que havia pousado do lado dele. Procura sacá-lo do inebriante estado de torpor amoroso em que se encontrava repousado. Sem que ele soubesse quem era. Ainda mais que caveira não fala.
Irritado e constrangido, ele a enxota, ironizando:
– Quem é você? Mulher, homem ou viado?
Magoada, a bate-bola emudece, retira-se do palco e liga a TV, nada mais apropriado que a quaresma para se refletir sobre pecados capitais cometidos no carnaval, enquanto máscaras e fantasias adormecem no porão. Sobressalta de indignação ao ver Edmundo, o Animal dos campos de futebol, sem máscara, mas com a bandana do Detran que orientava: “Se for dirigir, não beba. Se beber, não dirija”. Em pleno gozo do hábeas corpus que faz jus por ser primário e primar pelo bom comportamento, muito embora ao dirigir radicalmente, ter se enrascado num acidente que provocou a morte de 3 imberbes, cujo singular mal que os uniu na cova foi ser inocente.
À máscara de abnegação em proveito de uma causa do trânsito, ela preferiu aplicar ao rosto uma máscara de cosmético e fechar os poros: o sentenciado não pode sofrer abuso do poder na sua liberdade de locomoção até o remoto veredicto final, àqueles endinheirados que passam nos cobres a Justiça, lhes é reservado, inclusive, o direito de até tripudiar.

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Antonio Carlos Gaio
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