X

O HOMEM QUE NÃO PARA DE SE GABAR

O homem que se gaba demais de suas qualidades é justamente por lhe faltar uma penca delas ou uma em especial que não pode contar para ninguém. Nem ao seu melhor amigo, ou somente quando estiver desesperado e não puder sair da enrascada em que se meteu, quando não tiver outra saída. Revelando nessa hora o farrapo humano em que se tornou por precisar se gabar para dissimular suas fraquezas.
O fato de fingir e vangloriar-se de uma qualidade é uma confissão de não a possuir. Quando um homem se gaba, seja de sua coragem, inteligência, sucesso com as mulheres ou posição social, demonstra como restou frustrado e incompatível com sua existência depois que perdeu a cobertura que a mulher lhe dava, quando ela sacrificava sua própria trajetória em prol do chefe de família.
É natural que nenhum homem queira se revelar plenamente como ele é, visto que muitos dos frutos que colhe de sua árvore genealógica contêm elementos bestiais de sua natureza que precisam ser ocultados, como a desumanidade, a sordidez e a baixeza, tornando-se repugnante quando assim se transmuta a olhos mais atentos e críticos, que também costumam decodificar a hipocrisia no ato.
Sendo melhor, para evitar a bestialidade, optar por ser um gabola inofensivo que apenas conta vantagem. Um mentiroso repetitivo que não ofende ninguém, tão somente pretende enganar. Um hipócrita é mais fácil de ser assimilado do que um caráter devasso, se o eleitor é contumaz em falar mal da classe política, horrorizado com a corrupção e a hipocrisia que campeia, mas que, ao votar, escolhe justamente os mais falsos e que apregoam um discurso moralizador que jamais porão em prática – o que nos causa estupefação, se é por ingenuidade ou se por cerrar fileira com o mesmo biotipo.
Ainda assim é preferível aos olhos dos outros o homem que não para de se gabar ao invés do que diz tudo o que pensa de forma contundente, regido por um espírito agressivo, que machuca sem compaixão a sensibilidade dos que estão à sua volta.
O gabola tem perfeita noção de até onde pode ir com toda a encenação da qual se tornou dependente. Total domínio do fato. Porque é sabedor de que não levam a sério o contador de histórias, escarnecem do loroteiro, desprezam o lero-lero, já que o folclore é preferível à crueza da realidade. Por isso vive uma farsa se tem plateia para tanto. E se de lá pinça uma donzela, que aprecia um homem delicado, conversador e que lhe dá atenção. Se nem tudo que ele fala é verdadeiro, pelo menos é bom ouvi-lo se gabar da mulher com quem se casou. Confessar que é areia demais para seu caminhão. Mesmo que soe demagogo. Se infla o ego dela, que necessita de massagem tanto quanto o do gabola. Uma sintonia surge entre os dois, criando um vínculo em que ambos se amparam.

Antonio Carlos Gaio:
Related Post

Este site usa cookies.