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O APARENTE DESPROPÓSITO DOS INFORTÚNIOS

Ao suplício de uma existência, ao mesmo tempo a melhor expressão de sua fascinante aventura. Querer entender não adianta: quanto mais entendimento, mais limiar de novas procuras, buscas e ignorâncias, logo seguidas de novos impasses, cansaços e desilusões. Mas desistir de sair em busca e conhecer, recolhendo-se ao batido repertório de ideias, opiniões e impressões que já se tem cristalizadas, é permanecer nas trevas. Quando estamos imersos no caráter cíclico da Natureza e das coisas sujeitos à lei do eterno retorno. O grande conhecimento do Todo passaria pelo Uno e vice-versa. Como entender o que deu causa ao ser humano? Se a sua mente, lógica e racional, pouco capta os mistérios do Universo, daí a irreversibilidade da condição humana: a de não desistir e ser necessário empreender. Porque só assim o homem pode ser sacudido por um súbito clarão e obter a revelação. Revelação seria a forma de entrar em conexão com sua essência espiritual. Saber que existe outra vida além da nossa, e muito maior e mais abrangente, menos particularizada e egoica, dando sentido a essa que estamos vivendo, tão questionada face ao aparente despropósito dos infortúnios.
Quando não conseguimos explicar por que morremos tão cedo, quando faltava tanto por ser realizado. Ou tão tarde, quando não havia mais nada por fazer aqui. Quando não conseguimos explicar por que cedo desaparecem de nosso convívio pessoas com imaginação, caráter ou generosidade. Por que perduram os que estão sempre armando golpes, mentindo o tempo todo, ases no ato da rapina.
Sopram aos meus ouvidos: por não estarmos vendo o Todo. Por não sermos Deus em sua onipresença. Por crermos no mal abundante à primeira vista e custarmos a enxergar a virtude, que se faz presente sem alardear as consequências, quando menos se espera. Por não conseguirmos nos despir do apego à materialidade do cotidiano para nos alimentarmos das coisas do espírito e elevarmos nossa alma. Por não sabermos conciliar interesses e necessidades tão antagônicas. Por não conseguir nos dividir em mais partes e atendermos a quem nos procura, preferindo o refúgio na unidade, entocando-nos, com receio de agregar e abandonar a habitual identidade. Para tornar-se no que irá ser revelado e sua vida ganhar sentido.
Antonio Carlos Gaio:
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