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QUE INVEJA TENHO DOS POETAS!

Como eu sinto inveja dos poetas!

Por fazerem uso da liberdade
como bem entenderem
sem jamais temer as consequências.

Se mal urdido o poema,
enfrentando as regras
sem se amedrontar,
confiando que a beleza surgirá ao final
tal como o alvorecer do sol
não nos falha.

Irrita o poeta
por mexer naquilo
com que não se deve brincar,
ainda mais se jactando
de lúdico.
Por não ter idade,
não se obrigar a uma identidade sexual
ou o dinheiro não lhe trazer felicidade,
por ter plena consciência
de quem vive de poema
é pobre.

Pobre de espírito o poeta
ter certeza de estar ao lado de Deus
com a humanidade
tendo muita conta a prestar,
enquanto o menestrel canta e verseja.

O poeta é, sobretudo, inteligente.
Ninguém vai duvidar de sua cabeça
se enfiar em tantos conceitos,
disfarçados de questões,
num curto pedaço de papel,
quer maior concisão
e despojamento?

Além do mais,
o poeta está sempre próximo
do suicídio
por não encontrar solução
no amor,
acusado de ineficiência
por não saber gerir a vida.

E quanto às doenças?
Tachado de hipocondríaco!
Um psicanalista que não cobra por sessão.

O poeta é,
antes de tudo,
um forte,
a despeito de menosprezado como poetinha,
vagabundo
e de aparência suja.
Mas ele não dá a menor bola
pro que os outros falam.
Se desse, não seria poeta!

Desafiam o poeta a ser escritor,
romancista, historiador,
acadêmico, erudito,
um clássico,
mas é apenas um poeta.
Um grande poeta
reconhecido no seu meio,
que é o que interessa.

Quem deseja casar com um poeta?
Se nunca irão levá-lo a sério!
Puro despeito,
poeta faz amor como ninguém!
Se, por trás de cada rima,
vem uma provocação
que atiça a sensualidade
e desata o nó da hipocrisia,
molhando as partes íntimas,
o segredo inconfesso de cada mulher.

Que inveja eu tenho do poeta,
por ele ser tudo
e eu, nada!

Antonio Carlos Gaio:
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