Não pude jogar futebol profissional por ser considerada profissão de vagabundo à época dos campeões do mundo na Suécia e meus pais exigirem de mim um diploma que valorizasse o que não conseguiram aprender através das faculdades mentais das universidades. Em compensação, ao realizar seus sonhos, tornei-me um vagabundo longe de suas vistas, porque já haviam morrido, tal qual o escritor é considerado se não fizer sucesso – eufemismo de malsucedido. Embora nunca tenha perdido o meu sorriso aberto e arteiro que, aos olhos dos outros, soa como bon-vivant, por estar sempre agarrado ao prazer – o que facilita escrever. Por não ser bem compreendido, fui condenado por não ter filhos ao tempo em que me dava maravilhosamente com as crianças – que pecado! Fui constrangido pelo amigo que tinha em mais alta consideração, quando exibiu um uísque raro que resolvi não servir em festa dada em minha casa, tão bem escondido eu pensei guardá-lo. Fui constrangido pelo amigo que eu pensava ter consideração por mim, redirecionando o convite pro lançamento de meu próximo livro para um outrora amigo e irmão, só para ele pensar que eu queria me reaproximar dele – a crueldade atirada pra tudo quanto é lado. As palavras da vida não têm outro mundo para se manifestar que não esse. Por isso, não se é bem compreendido, só restando encontrar a voz amiga no silêncio das coisas.