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HANNAH ARENDT E A BANALIDADE DO MAL

O filme “Hannah Arendt”, de Margarethe von Trotta, não é somente o encontro da judia Arendt com o nazistoide Adolf Eichmann no julgamento em Jerusalém e sim sua coragem e força devotada ao pensamento, muitas vezes confundido com arrogância por ela não temer bater de frente com a comunidade judaica. 
Essa grande mulher, uma das maiores pensadoras do século XX, desenvolveu em nível socrático e em tempos sombrios toda a sua filosofia dedicada à compreensão do mundo e sofrendo a solidão de seu pensamento e o isolamento de seus amigos. Segundo ela, tudo compreender não é tudo perdoar, seja os regimes totalitários, fascistas ou comunistas, ou tampouco Eichmann. Compreender os males que assolam a espécie humana é uma tentativa de se reconciliar com as intempéries do mundo, que se sucedem sem parar.
A maior controvérsia em torno de Hannah Arendt gira sobre a banalidade do mal. Ao invés de ser radical ou demoníaco, o mal é banal. A causa disso é a irreflexão, a falta de pensamento, a preferência pela superficialidade, pela trivialidade, abdicando da humanidade para pensar. Traduzindo, quanto mais a pessoa não se aprofundar e preferir se manter à superfície, mais provável ceder ao mal. Basta, portanto, resistirmos à banalidade do mal ao não nos permitirmos ser arrastados pela platitude e ao caráter dos sem expressão e medíocres, principiando a pensar em abraçar outra dimensão que não o horizonte da vida cotidiana. 
A banalidade do mal foi errônea e fanaticamente interpretada como se Hannah Arendt estivesse se referindo à tragédia das vítimas do holocausto como algo banal. Assim os judeus entenderam, de forma reativa, quando se sentiram injustiçados por ela abordar o colaboracionismo judeu com as práticas de extermínio e tripudiar sobre a passividade com que o povo judaico se encaminhou para as câmaras de gás sob o comando da máquina nazista, aguardando uma solução que viesse dos Céus e sustasse a Solução Final. Arendt já havia negado em suas “Origens do totalitarismo” a vinculação do extermínio nazista à perseguição aos judeus ao longo da História das civilizações. 
A tese difícil de aceitar é de não ver em nazistas que não pertencessem à cadeia de comando um antissemita fanático, que só teria na vida o propósito patológico de exterminar judeus, e sim apenas a ambição por progredir em suas carreiras e subir na vida, a despeito do que o nazismo fazia à sua volta. Com Hannah Arendt comparando-os aos burocratas que vivem no mundo de hoje, cujos objetivos são os mesmos, considerado por ela como a mediocridade pequeno-burguesa. Partindo do pressuposto de que a fenomenologia do mal se manifesta na superficialidade das coisas face à normalidade das condições em que se reproduziu a monstruosidade atípica dos crimes nazistas em tão pouco tempo. O nazismo dependeu de pessoas que não pensavam ou que somente o faziam baseando-se em clichês ou lugares-comuns para não ter o que pensar, deixando-se levar pela engrenagem. 
Embora o grande pensador e filósofo Heidegger, a maior influência de Hannah Arendt e seu amante, em seus tenros 17 anos, a tivesse orientado a não partir para a polêmica, onde predomina o embate e não há pensamento, somente opinião e achismos, de modo a interpretar os fenômenos e pondo a lume o que aí se manifesta para atingir seu verdadeiro eu, conforme ele posteriormente faria aderindo ao nazismo como reitor da Universidade de Freiburg. 
Nosso mundo é capaz de produzir muitos Eichmanns, que, sem que sejam percebidos como tal, alguém terrível e horrivelmente normal, são peças decisivas para engendrar uma máquina que se aproprie de nossas mentes, sendo necessária uma permanente vigilância para garantir a defesa e a preservação de nossa consciência.

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Antonio Carlos Gaio
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