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BURACO NEGRO

O espírito humano inevitavelmente entra em crise ao não atingir nenhuma certeza a respeito do que ordena o sentido de justiça que norteia a vida e a morte. Teria que voar alto, mas não consegue decolar, em face de sua necessidade de caminhar somente em terra firme, da qual não abre mão. Assaltam-lhe dúvidas desde que se entendeu como gente e, à medida que os problemas cresceram, ele não deu conta. O farto conhecimento acumulado não o proveu de sabedoria essencial para uma compreensão metafísica, religiosa ou absoluta do real.
Quanto mais o tempo passa, mais descrê da moral, religião ou de instâncias superiores de qualquer natureza que possam vir a socorrê-lo. Mina o conceito de História como progresso. Acredita que a vida não faz sentido, pois vivemos numa tragédia grega, e nada vai dar certo a longo prazo porque todos estaremos mortos. E que o Universo se encaminha para um enorme buraco negro, onde tudo que existe de inútil, sem rumo e ao avesso – a cultura do lixo – será arrastado e triturado.
Fazendo surgir a entropia, à proporção que parte substancial de sua energia vital se esvai. Se algo se acumula é o entulho de seu ser. Um regressivo deixar de ser. Quando o sujeito perde energia no plano físico e espiritual, ocorrem mudanças em seu estado, com perigosa tendência à degradação, correlacionada à desordem mental, contribuindo para ensimesmar o espírito, que involui.
Mas, no meio desse furacão mental, ele ainda se preserva e joga suas últimas fichas em momentos fortuitos de felicidade. Pragmático, acha que vale a pena arriscar em qualquer elixir que proporcione alívio. O que estiver ao seu alcance para tentar ser feliz, pelo menos temporariamente, enquanto vivos permanecemos, do jeito que for possível.
Não guarda ilusões: os seres humanos são egoístas, cruéis e indiferentes aos que cruzam seu destino. Embora cultive uma boa-fé de que não se deve ferir aos outros. Mas não leva fé nas religiões, nem mesmo na filosofia marxista, porque ambas demonstram um enorme fervor na Humanidade. Por ela ser intrinsecamente boa, bastando dar uma oportunidade para que todos sejam generosos e bonzinhos.
Revela-se um poço de contradições. Nada mais natural que o buraco negro queira sugá-lo. A crença na descrença, de caráter depressivo e desanimador, o arrasta para o buraco negro. Se ouvir “por pior que seja o buraco em que você se encontra, lembre-se que ainda não tem terra por cima”, deflagra a síndrome do pânico.
O empobrecimento leva à tristeza de perder vínculos e posses, mas a verdadeira riqueza é a alegria em livrar-se de arquétipos ultrapassados e de becos sem saída. De simplesmente não ter nada mais a que se opor, quando parou de se sentir impotente perante os que cultivam a fé. Quando deixou de se frustrar, por não conseguir sentir fé tal como o mais comum dos homens – até por discriminá-lo. Quando estancou a raiva de devotos em torno de uma causa. Discriminando fé de fanatismo. Quando descobriu que fé é amor.
Reaja enquanto há tempo.

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Antonio Carlos Gaio
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