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O HOMEM E A BUSCA PELA COMPLETUDE NUM AMOR QUE AINDA NÃO VEIO E NEM SABE SE VIRÁ

Não é irrelevante o número de homens que não conseguem se decidir por quem amam ou assumir um relacionamento de verdade com a justificativa de não amar o suficiente para encerrar a polêmica. Não conseguem definir sua situação até que sua namorada esgote sua paciência e o mande pastar. Aí ele ergue as asas, levanta voo e muda de pouso. De fino trato, boa aparência, cavalheiro e sempre solícito, não faltará quem lhe dê guarida e proporcione boa acolhida. Até para ele compartilhar seu melodrama e ela se imbuir do propósito em transformá-lo. Por achar que vale a pena investir nesse pedaço de mau caminho cheio de boas intenções. Ainda mais sendo amoroso, afetivo e apaixonado em momentos escolhidos a dedo para alcançar um clímax e impressionar.
Goza da fama de cafajeste por parte de quem quer distância por temer seus efeitos e a possibilidade de vir a se apaixonar por um homem que brinca com o sentimento das mulheres. Goza da fama de mau caráter e de aproveitador por parte de quem o desdenha, mesmo sem ter sequer a menor condição para degustá-lo – você não vale nada mas eu gosto de você! Por parte de homens despeitados, um mero garanhão que cumpre seu ofício.
Não tem uma preferência específica sobre tipo físico. Já namorou vários perfis de mulheres: magras, mais cheinhas, negras, loiras. Não é a parte física que conta para ele, embora poucos creiam, desprezando-o por acharem que está jogando para a plateia. O que conta é o envolvimento. O olhar e o sorriso o atrai e o cativa, por falar muito sobre o que é a pessoa. Quando ela se aproxima e o conhece melhor, por transparecer um viajante em seu modo de ser, percebe sua essência e vê que não age por maquiavelismo ou estratégia.
Platão, o grilo falante de Sócrates, é crucial a respeito do amor: o que se ama é somente aquilo que não se tem. O objeto do amor pode não se manifestar e mostrar-se sempre ausente, mas sempre será solicitado. Encontra paralelo na verdade, algo que sempre pensamos ter alcançado, até flagrá-la escapando por entre os nossos dedos ao mudar sua interpretação. Essa inquietação na origem de uma busca, visando uma paixão ou um saber, faz do amor um filósofo. E filósofo está sujeito a diversas interpretações de como a ele o amor é sugerido e se insinua e se infiltra. E isso não é bom para o amor, que exige certezas.
No século IV antes de Cristo, Platão, no seu livro em diálogos, “O Banquete”, diz que amar é desejar. Se o desejo se extingue, Eros (a quem chamava o Amor) acaba também. O desejo é a busca do que faz falta, é a energia para buscar o que não temos.
Do confronto entre as ideias de Platão e Lacan sobre o amor verificou-se que tanto a tese filosófica como a psicanalítica concebem o amor como algo que falta dentro de si, como um buraco a ser preenchido sob o risco de um dia você ser sugado pelo vácuo que aparece sabe-se lá de onde, movido pelas incertezas da insatisfação. A diferença entre os dois está no fato de que Platão dispõe sobre o amor enquanto falta ou privação, como um desejo e inspiração para a completude, para o se sentir pleno, de tal forma possuído pela divindade, e assim pôr as mãos no Bem, que enseja as condições ideais ao equilíbrio, ao aprimoramento, inclusive moral, trazendo alívio, vantagens e bem-estar. Já para Lacan, o amor é uma falta constante que suscita a busca da completude de um amor perdido, desejando sempre reencontrá-lo.
O fato é que, na visão da psicanálise, o analisando é aquele que, ignorando como funciona o seu desejo e partindo de uma falta estruturante, ama aquele que supõe responder ao que ele não conhece. Segundo Lacan, o analisando espera encontrar o amor, para amar o que pensa se esconder como saber no Outro. Por isso, o que o analisando vem a amar é o saber sobre o seu desejo, o que justamente ele não conhece. A transferência de amar no Outro o saber, a busca de conhecimento, no desejo de se sentir completo. Portanto, é justamente por acreditar haver uma resposta às dúvidas quanto ao que lhe falta naquele que ama, é que ele vai ao encontro do que crê estar oculto no Outro, de modo a atender ao seu desejo de não mais encarnar um ser dividido. Ele procura o essencial, que são sempre a Verdade, o Bem e a Beleza, que não representam senão a manifestação da mesma e única realidade suprema, o próprio Deus. Neste sentido, o Amor é, sobretudo, o intermediário entre o humano e o divino.
Como o homem poderá ter certeza de que em sua musa se encerra todo o conhecimento a respeito de seu desejo, por vezes de uma alma vagabunda? Se está oculto como uma cabala que precisa ser desvendada? Vai ser necessário depositar confiança, ou melhor, fé irrestrita nessa mulher, que o retirará da descrença para revelar sua verdadeira alma, apartada de um personagem solitário e insatisfeito que sempre interpretou.

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Antonio Carlos Gaio
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