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RETORNO A ÍTACA

Retorno a Ítaca

Retorno a Ítaca

Segundo a Odisseia de Homero, Ulisses era o rei de Ítaca quando os gregos partiram para Troia. A guerra durou 10 anos, mas ele levou outros dez para regressar à sua ilha natal, após inúmeras aventuras depois de ter navegado pelo Egeu e pelo Mediterrâneo, enquanto sua esposa Penélope o esperava no tear durante o dia, para desfazer o que teceu à noite e iludir os inúmeros pretendentes que queriam usurpar o trono e que já consumiam os bens de seu marido, todos posteriormente assassinados por Ulisses. A parábola de Ítaca incide no personagem de Jorge Perugogía, que resolve voltar para Cuba depois de 16 anos de exílio na Espanha e discutir o regime cubano, com o filme tecendo severas críticas, mas de forma honesta e arrazoada, não à sua essência e sim às consequências, como faltar gêneros de primeira necessidade e imprimir um padrão de vida pobre, inibir ou vetar trabalhos artísticos considerados fora do enquadramento no realismo social, os mecânicos de Cuba serem os maiores do mundo para fazer funcionar até hoje carros americanos dos anos 50 que se transformaram em verdadeiras relíquias, e a investigação, controle e perseguição dos inimigos do regime pelo serviço secreto – tema tabu não abordado por Fidel Castro. Evidentemente que o filme não interessará aos eleitores que mandam os petistas e esquerdistas pra Cuba, por não ser maniqueísta e condenar o regime cubano. O francês Laurent Cantet, diretor de “Entre Muros”, o vencedor do Festival de Cannes de 2009, é coautor do filme em dupla com o mais famoso escritor cubano da atualidade, Leonardo Paduro (que optou por ficar em Cuba sem desistir de fazer críticas ao regime). O filme envereda por abrir uma discussão entre personagens como um negro fechado com o regime, até por ser negro, um que tirava proveito da máquina do Partido Comunista e alvo de investigação, uma médica cujos filhos foram morar em Miami, um pintor cuja pintura abstrata foi censurada e que desistiu de pintar, e outro que parou de escrever pelos mesmos motivos. Num cenário maravilhoso no terraço de um prédio, vizinho a outros tantos descascados pela erosão do tempo e do regime, com uma bela vista para o malecón e a baía de Havana, captando o som local e a essência singular do povo cubano, que nos recorda o famoso dito: “Uma Madureira que deu certo.” O filme é uma sessão de psicoterapia sócio-política que, por meio de suas histórias cruzadas, permite revisitar a história recente de Cuba, as esperanças de toda uma geração que acreditava na revolução e que teve de acordar para a dura realidade.

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Antonio Carlos Gaio
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