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VIAGEM DE UM VOYEUR

Eu entrei tranquilo e de cabeça vazia num restaurante grego para degustar sua culinária saudável ao mesmo tempo que um homem grisalho se sentou próximo, à espera que sua namorada chegasse.
Quando ela chegou, nossos olhares se cruzaram. Achei-a muito parecida com uma dileta amiga, igualmente de cabelos anelados e extremamente magra. Nada mais que isso.
Num segundo olhar, não imediato, notei que o grisalho era muito cuidadoso e afetuoso com ela. Tipo boa gente, não merecedor de uma facada pelas costas. Até que meu olhar acabou se desviando para ela, sem segundas intenções, apesar de não termos a menor ingerência sobre o que se passa no nosso inconsciente.
Percebi que ela não correspondia ao interesse demonstrado por ele em seu olhar doce e nada envolvente, distante de um reles conquistador, com a melhor das intenções. Não que ela impusesse uma barreira entre os dois, mas não se observava a mesma vontade. Não que houvesse desejo entre os dois, mas uma aproximação em curso era notória.
Num terceiro olhar, mais longínquo, eu devo ter sido invasivo para descobrir quais eram suas reais intenções, o que a obrigou a mudar de cadeira e ficar de costas para mim, pensando provavelmente que eu estava paquerando sua distinta figura. Sem que o grisalho reparasse a perturbação causada pela troca de olhares.
O que só veio a confirmar que ela estava em dúvida a respeito do grisalho, se devia ou não abraçar essa relação, e não queria que a indecisão fosse flagrada pelo meu olhar fotográfico. Mas com certeza continuou a pensar que eu estava querendo me intrometer e atraí-la para fora do círculo estreito que se formava, trazendo insegurança. Ela precisava de paz para decidir. Tudo que não podia acontecer era outro aparecer desejando conquistá-la, justamente nesse momento, trazendo instabilidade.
Momento em que surgiram a irmã do grisalho e sua sobrinha, as quais recebeu com muita afeição, formando uma família.
Saí do restaurante sem saber se era família que ela queria ou se a assustava. Se teria sido melhor excluir-se daquele círculo estreito antes que ficasse sufocada por um amor que não iria preencher suas carências. Talvez tivesse sido melhor não virar as costas para mim. Vai que nunca mais apareça uma chance igual a essa.
Problema que não era meu se sou um voyeur incorrigível, completamente inabilitado para suprir carências de quem quer que seja. Quanto mais quem me rejeita sem eu ter feito nada para um gesto tão deselegante, sem classe e agressivo. Vê se iria me acasalar com uma desclassificada como ela! Eu nem gosto de cabelos anelados, e muito menos de magricela e esquálida.
Ah, quase ia me esquecendo! Passei mal com a tal da comida saudável! A culpa só pode ter sido dela! Eu não posso carregar em minhas costas a pecha de conquistador barato por ser um contumaz voyeur.

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Antonio Carlos Gaio
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