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INDENIZAÇÃO

As avós da Plaza de Mayo, na busca aos seus filhos e netos desaparecidos, ganharam a guerra, ao não permitirem cicatrizar as feridas da ditadura militar argentina que, sob o pretexto de caçar anticomunistas, torturaram e mataram 8 mil presos políticos. Confissões de figuras sinistras surgem demonstrando temor de breve ser a hora de prestar contas a Deus.
A França decidiu indenizar vítimas do nazismo na 2ª Guerra – inclusive não-judeus -, massacradas por resistirem à ocupação, tocando na ferida que sucessivos governos franceses optaram por ignorar: o colaboracionismo do regime de Vichy. Que resultou em 99 pessoas enforcadas na cidade de Tulle após o desembarque das forças aliadas na Normandia.
O Chile retira das catacumbas o espírito de Salvador Allende e asfixia a alma penada de Pinochet. 30 anos relegado ao ostracismo, 13 anos de martírio para Luciano Carrasco quando, com 3 anos, presenciou seu pai ser arrancado de casa, levando-o a se suicidar ao se culpar pela omissão cometida – um trauma a merecer que Freud ressuscitasse. Obrigando o círculo da direita a bancar o ceguinho diante de programas de rádio e TV – armaram um show para canonizar Allende! -, chorando o leite derramado.
Já pensaram se a moda pega no Brasil e passamos a indenizar na boca do caixa vítimas de balas perdidas, chacinas policiais, falsas blitz, torturas em presídios, filas de hospital. Aí o país toma jeito, pois se pode responsabilizar civil e penalmente o alcaide que toma conta desta birosca, impichando e cassando políticos que fazem ouvidos de mercador aos amassos que a população sofre em ônibus, cantos escuros e ruas mal iluminadas.
Muito otimismo? Se desde a Guerra do Paraguai tivesse sido noticiado que os negros foram lançados na linha de combate e que Solano Lopez foi derrotado pelos escravos brasileiros, à frente de Duque de Caxias, os rumos do patropi seriam distintos do autoritarismo com que o coronelismo e caudilhismo perfilharam o Brasil. Daí a importância de indenizar as vítimas dos anos de chumbo para deixar registrado na história oficial extermínios, torturas, degolas e banimentos. Um estado de violência latente que permeia as classes sociais e desmente a falácia de que o povo brasileiro é pacífico e leva a vida numa nice, a ponto de ser carimbado como boa-praça e preto jóia virar marca de feijão.
Indenização não repara vidas, mas pesa no bolso e na reputação de políticos e instituições ilibadas. Representa uma saída para combater a iminência de guerra e a violência generalizada. Por comprometer até a raiz dos cabelos cínicos, psicopatas, trogloditas, rufiões, que eventualmente ocupam o trono do poder.
Não se enterra o mesmo corpo duas vezes. Se Allende renasce das cinzas e reacende o país, é porque a chama de seu espírito ainda aquece as apreensões de que a História pode se repetir. Netos e bisnetos não se contentariam com indenização, por já saberem, de antemão, que estariam mortos.

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Antonio Carlos Gaio
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