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HISTÓRIAS DE CONDOMÍNIO

José já era porteiro do condomínio barrense “As Palmeiras” há dois anos. Mas isso não era nada. Com quarenta e cinco anos de vida, já estava na labuta há trinta. Vinte deles só trabalhando em prédio. Todo dia, quando voltava pro seu barraco na Rocinha, tinha várias histórias para contar pra Maria Dolores, sua esposa. Da madame que atendia os porteiros e entregadores totalmente pelada. Do casal que envelhecera sem filhos e por isso tratava o cachorro como se fosse criança. Da briga dos moradores que não aceitavam que o vizinho estacionasse seu carro na vaga de visitantes. Cada dia, uma fofoca nova.
Então, Marcelo e Andreia se mudaram para “As Palmeiras”. Diretor de uma empresa do ramo esportivo, o trintão era pra lá de sarado. Todo dia, antes de trabalhar, acordava cedinho, corria na praia e puxava ferro na academia do condomínio. Andréia não ficava atrás. Dona de uma loja de acessórios num shopping ali perto, prezava a beleza acima de tudo. Alimentação balanceada, ginástica, yoga, drenagem linfática, botox… Recorria a todos os milagres da cosmética para se manter sempre linda. Sempre jovem. Mas não foi esse hábito que surpreendeu o porteiro José.
Numa determinada sexta-feira, Marcelo estava viajando. Como José lavava os carros dos moradores, para fazer um extra, já tinha sido avisado: Marcelo só voltaria na segunda-feira. E foi na sexta-feira mesmo que José viu Andréia sair sozinha pela primeira vez. E ela foi de táxi. Vestidinho preto colado, pulseira de prata, cintinho vermelho, olhos e boca pintados, maçãs do rosto rosadas e um salto alto vermelho de arrasar quarteirão. “Aquilo não ia prestar”, pensou o porteiro.
Dito e feito. Andréia voltou de cabelos molhados e sem maquiagem, às nove horas da manhã do dia seguinte. Se aquilo não era traição, José só poderia estar maluco. Durante o sábado inteirinho, só se falava nisso pelos corredores. Os porteiros e faxineiros estavam em polvorosa. Teve gente até apostando. Ela iria sair de novo no sábado? O placar marcou oito a um. Só José acreditou que Andréia não teria a cara de pau de repetir a dose. E acertou. Por pouco. Pois, no domingo, lá se foi a bela a sair de táxi, toda serelepe. E dessa vez ia de mini-saia, top decotado, bolsa prateada e sandália de prata de salto gigante. Parecia uma prostituta. Piranha de luxo.
Na segunda-feira, só mudou um detalhe. Ao invés de chegar às nove, estava de volta às cinco da manhã. E era trazida por um amigo. Dessa vez, sem cabelos molhados e sim com a maquiagem borrada e nenhum vestígio do batom vermelho do dia anterior. A boca estava roxa. Daquela cor que ficam os lábios quando acabam de sair de um delicioso e demorado beijo. Nem precisa dizer que os porteiros ficaram louquinhos da silva, né? E o assunto rendeu a semana toda.
No final da semana seguinte, Marcelo estava em casa. Andréia também. Mas então foi o “cornudo” quem surpreendeu. Sábado à tarde, deu uma saidinha a pé e voltou com uma gata loira, igualzinha àquelas saídas das revistas masculinas. E Marcelo estava cheio de amor pra dar. Olhares calientes, mãozinha esperta passeando na cintura… “O que está acontecendo com esse mundo?” José divagou. “Será que ele descobriu a traição da mulher e quer se vingar?”
O fato é que a tal loira só reapareceu no dia seguinte, quando foi levada à porta do prédio, carinhosamente, pelas mãos de ninguém menos que Andréia. Na hora da despedida, um abraço apertado, beijos nos pescoços e uma troca de carinhos tão saliente que José até pensou estar diante de duas lésbicas.
É, quando o porteiro José pensava que já tinha visto de tudo, vinha sempre outro morador com uma história nova a surpreendê-lo.

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Antonio Carlos Gaio
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