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NÃO QUERO MAIS CASAR

Homens que não querem mais se casar, que se recusam a assumir compromissos, ou a se envolverem de forma a enterrar seus desejos no primeiro sorriso aberto que cruzar o seu destino. Se deixar levar por uma onda passageira. Não se conformam que seus sonhos possam se desmantelar por um inevitável fatalismo inerente à luxúria das paixões. Não aceitam o descaso com o seu percurso. Não suportam, em nome da arrogância que bem esconde o temor diante de imprevistos. Como o de não ser amado, admirado e considerado. Necessitando fazer uso de truques para retê-la em suas malhas. Criar histórias para se autoconvencer. Cercar-se de todas as garantias para se assegurar de que ela não escapará. Para que esquentar a cabeça se, no final das contas, as mulheres não têm o menor escrúpulo em atravessar seu samba na maior das evoluções? Ou interromper o orgasmo onírico no auge de sua exibição?
Melhor se acoitar na doce irresponsabilidade. Cercar-se de homens em bares e botequins, sem cair na arapuca da homofobia. Para comentar sobre as distintas senhoras e senhoritas que desfolharam a margarida e subiram no palco, se colocaram em vitrines e puseram seu bloco nas ruas. Em bandos. A escolher, ao invés de serem sorteadas. A intimidar, ao desistirem de passar por boas moças. Eventuais falhas ou despreparo serão saneados no âmbito de muvucas, à meia-luz, no som que sufoca palavras nem tão sinceras, e no frigir de ovos.
Contudo, os homens sempre querem mais. Não se contentam com pouco. Aqui vieram para conquistar. Nem que tenham que se livrar de estratégias e doutrinas que os acompanham desde os primórdios. O tempo urge, embora não reconheçam que se trata de uma questão de sobrevivência. Basta retocar o seu corriqueiro status.
Alguém tem que ceder. Se é que algum dia eles cederam. Se invocada a memória, preferiram se omitir. Odeiam dar satisfações. Explicar o quê, quando se embrenham em outras paragens? O seu teto baixou depois de experimentarem anos de convivência – que hoje em dia se transformaram em breves encontros – sob o tacão de mulheres que os obrigaram a respirar o dia-a-dia sem descanso. Agora querem se libertar de tarefas, encargos, providências, da escala de horários, do revezamento de papéis que confundem o seu eu, de interferir na conduta moral da sociedade conjugal a que pertencem. Mesmo porque não têm mais ingerência no seu futuro, suprimiram-lhe a última palavra.
Melhor pedir demissão e atarraxar a máscara do cinismo. Fingir-se de pai, procurar ter um relacionamento de alto nível com a ex e manipular as caras novas. Sabendo se desvencilhar das que se fazem de difícil e oferecem em troca um outro quebra-cabeça para brincar. E se enredar. Cuidado, o amor pode pôr tudo a perder. Fazer uso da liberdade é uma arte e requer profissionalismo.
Não se submeter a apelos para um juízo fundado na convivência estreita, o padrão normal da sociedade, e correr o risco de viver à margem, uma estranha criatura difícil de ser rotulada. Solitário, dizem, embora se aperceba em seus olhos o bruxulear do desejo. Pouco adianta, se levantam suspeitas sobre quem marcha desacompanhado. Paira uma exigência para que escolha, sem mais delongas, a sua eleita. A indefinição não cai bem, lançam sobre os seus ombros a pecha de imaturo, complicado, excêntrico, arredio. Seu destino na eterna procura intranqüiliza quem o observa, o contágio ameaça.
Ele pode não estar realizado nem feliz, mas de maneira alguma quer voltar atrás ou reproduzir seu passado, ainda que não se arrependa. O futuro é o presente perfeito em que constrói no infinito o mais-que-perfeito do indicativo com particípio no passado, se é que restou algum gerúndio. Livre do condicional, se sente como um pássaro, a voar com as asas da liberdade. Que abre as portas pra todos nós. Cantarola na música a alma feminina. Como ninguém. Ele na poesia e ela na platéia. Um casamento perfeito.

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Antonio Carlos Gaio
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