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O PAÍS DAS MARAVILHAS

Pentacampeão, pentacampeão, é penta, Rivaldo orquestrou como nunca ousou antes porque era atacante artilheiro apenas, Ronaldinho Gaúcho provou que no sul não impera só rigidez tática, Cafu exagerou em chegar a 3 finais de Copa, Roberto Carlos impôs sua categoria do Real Madrid que mete medo, e o 4º “R”, o milagre que comprova a existência de fenômenos, que de tanto existirem e não vermos, precisa se repetir à frente do planeta para que se removam dúvidas e suspeitas que cercam a capacidade de dar a volta por cima – a recompensa virá se lutarmos até o fim.
Pentacampeão, pentacampeão, é penta, eu era feliz e não sabia, com ou sem Garrincha sempre fomos os melhores, como é bom dar uma de débil mental, libertar-se pra uns, infelicidade pra outros, pôr a cabeleira loura, assoprar cornetas insuportáveis, cobrir o bom cabelo com a bandana, suspirar por biquinininhos que não daria conta se soubesse o que tem por trás, abraçar o Galvão Bueno, e saber que lhe aguarda, de braços abertos, aquela camisolinha verde-amarelo, agora que o Felipão nos liberou pro sexo interditado nas madrugas da Copa e não vai nos matar mais do coração.
Por falar no hômi, nunca é demais dar o braço a torcer, se xingou tanto o avozão querido, o tio gaiato e o pai de todos nós órfãos do futebol-show. Cotocos de comentaristas e cronistas de araque a quem nenhum resultado consegue agradar, viúvas que pranteiam um passado que não volta mais, a exigir que Beethoven se cure da surdez, Ayrton Senna desacelere da morte e Pelé acerte ao menos uma previsão. Se Felipão deu certo, danem-se os entendidos, vão curtir a fossa no meio do povão e aprender a não torcer mais o nariz para quem consegue dar o drible da pedalada ou da lambreta. Pouco importa se manteve a virgindade da linha de defesa em bolas aéreas, se engrossava o folclore gaúcho e reforçava os preconceitos que o cruel esporte bretão cultua, exacerba e nos garante um jazigo perpétuo no cemitério dos primatas.
Felipão expandiu a era Dunga acentuando o primado gaúcho no futebol brasileiro. Tem todas as razões para se sentir magoado com a torcida e a crítica especializada, mas como, se a conquista foi feita para se comemorar, o deus Baco que o diga. Vocês vão ter que engolir ficou batido, a crítica faz parrrte, é démodé rolar cabeças, há que voltar atrás renitentes perfeccionistas e ofendidos, é o que mais desejam os técnicos retranqueiros. Afinal, somos penta e a união faz a força.
O que mais o irritava era comparar sua família com outras seleções do Brasil campeãs do mundo, descabe ajustar 2002 a 1970 ou enquadrar em 1958, quem não entender que o futebol vive outra realidade, vive fora desse mundo, como que a exigir do Big Phill a realização do sonho do dream team.
O futebol perdeu a sua diversificação de escolas e de estilos, embora de origens diferentes uns ficaram muito parecidos com outros, a disputa é entre o monocórdio versus o inesperado de três erres, fazendo a diferença nossa qualidade técnica insuperável, muito embora Felipão tenha sempre realçado a importância da tática, no papel do treinador perante o grupo. De madrugada, não deu para enxergar esquema algum – o último de relevo foi o do PC Farias.
Dedo do Felipão sim é ter o grupo na mão e substituir a estrela que bem entender a hora que quiser, para evitar deslumbramentos e desvarios que causam convulsões em qualquer família. Impôs um regime de concentração germânico ao estilo corralito, onde lhes foi suprimido o acesso ao celular, privando-os da condição de empresários na aparência e nos negócios que pintam. Cortou a mínima possibilidade de sexo afetivo, não o animal, complementado por revistas pornôs. Severo, rude, impositivo, cortou o mal pela raiz, em matéria de disputa quem entra em campo é o espírito.
Ao Romário não lhe foi permitido mais esse glorioso título, mas esteve presente em inúmeros atos falhos do treinador e na inspiração do gol de biquinho de chuteira do Ronaldinho – fez um igual contra a Suécia em 94, só que de fora da área. Mas Luizão nos fez esquecê-lo contra a Turquia nas duas vezes, vencedora a tese de que a figura do desagregador ameaça a moral da família, não há mais espaço para superegos dos acima da média em prol da união e coesão.
Sintoma mais do que significativo de uma época que precisa reafirmar a existência de Deus através de seus valores que consagram a benção na família e tornam possível a recuperação de Ronaldinho, cuja convulsão seguida do rompimento do joelho, que o obrigaram a conviver com boatos de que nunca mais seria aquele jogador que virou Fenômeno, foram fragorosamente derrotados. Sintoma não captado pelo goleiro Kahn em suas previsões, o povo alemão é racional e lógico, não poderia funcionar no confronto com o místico, não se tem notícia de bruxas teutônicas.
Os impropérios lançados contra os jogadores na final funesta de 98, comparável a 1950, centravam o fracasso em Paris nos dólares da Nike, associado ao Fenômeno que ruiu. Ao se sentir humilhada, a torcida brasileira se consolou na teoria conspiratória de que passaram o selecionado nos cobres, a chacota foi do Oiapoque ao Chuí. O que magoa, pois se começarmos a pensar nos detalhes fica um pouco difícil imaginar o Ricardo Teixeira ordenar a cada um a comparecer no caixa em plena Copa do Mundo, a despeito do coronelismo imperar no futebol. O bochicho engrossou o caldo com as CPIs do futebol repercutindo nas eliminatórias de triste memória. De origem humilde, a perda do carinho da torcida refletiu a sarjeta, a indiferença, o descrédito, os jogadores tiveram de se superar – parece que necessitamos ser achincalhados para recuperar a auto-estima, adquirir equilíbrio emocional e vencer. Malhados, reagimos, afinal, não somos judas. Tiveram que provar não ser uma geração fracassada.
Toda Copa do Mundo, por ser uma guerra, tem suas versões fiéis à realidade. De quem? Só uma delas vira lenda, a história oficial de heróis como Ronaldinho, uma Alice no País das Maravilhas – Brasiiilll! – que superou bruxas e dragões da maldade e virou santo guerreiro.

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Antonio Carlos Gaio
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