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GIORDANO BRUNO E A NATUREZA

Giordano Bruno viveu a alvissareira época da pós-descoberta da América, sob os ares ainda impregnados da tradição renascentista dos simpatizantes da magia e do ocultismo, acreditando na liberdade, na tolerância e no direito de dizer o que se pensa, não importando o reino ou o ducado no qual o acolhiam. 
À primeira vista, adotou uma postura aparentemente conservadora ao reprovar a colonização da América, bem como a exploração de ouro e prata a que se seguiu. Não atribuiu a nenhum direito especial do homem branco que o autorizasse a submeter os nativos. A conquista do Novo Mundo só serviria para perturbar a paz do próximo, violar as próprias pátrias das regiões, redobrar os defeitos mediante o comércio e agregar vícios aos vícios de cada povo, mediante a violência, além de inculcar novas loucuras e demências inéditas onde não existiam.
Enfim, ensinar os instrumentos e as artes da tirania para assassinar a quem não se tornasse vassalo. Desmantelar a herança cultural de lendas, ritos e costumes e confundir o que a previdente Natureza distinguiu, ao que acrescentou:
– A Natureza não concebeu e produziu tantos e tão vastos corpos celestiais, nobres e perfeitos, invariáveis, eternos, divinos, sem nenhum outro propósito que o de servir a esta Terra mutável, transitória e perecível, repositório dos detritos do Universo e esgoto de toda a imundície.
A irritação maior dos inquisidores e do papado derivou da convicção de Giordano Bruno quanto à existência de uma infinitude de mundos e da possibilidade de outras vidas no Cosmos, o que implicava em duvidar de ter Deus feito a Terra a razão de tudo e do Homem como o objeto único da Criação. Reduzia a Terra a uma poeira cósmica perto da magnitude do astro-rei e, em conseqüência, rebaixava a Igreja Católica, a caminho de um retorno perigoso a eram os deuses astronautas, rompendo com o monoteísmo oficial e monolítico, tão penosamente construído desde a morte de Jesus Cristo na cruz.
Giordano Bruno celebrava outros tantos sóis e planetas, por não haver centro no Universo. O seu centro está em toda parte e sua periferia em parte nenhuma. Porém, quanto mais mundos houvesse, maior ainda seria o reino de Deus. Via mesquinhez e mediocridade em acatar-se o princípio de que o universo que nos abraça, composto de tantos corpos heterogêneos, girava apenas para atender às conveniências da minúscula Terra. Só os matemáticos bisonhos e os filósofos vulgares é que construíam escudos invisíveis no Céu, fechando-o inutilmente à passagem dos espíritos abertos.
A rivalidade entre essas visões cósmicas mal disfarçava as crescentes diferenças entre a alta prelazia e os sábios laicos, entre a teologia e a ciência, entre o sagrado e o profano, entre as diversas correntes espirituais que pugnam umas contra as outras em torno da origem da Vida.
Por não pertencer a nenhuma corporação acadêmica ou ordem religiosa que intercedesse a seu favor junto à Cúria Romana, o suplício de Giordano Bruno provocou uma irreparável desconfiança da ciência para com a religião. Ao se sentirem ameaçados pela fogueira da Inquisição, os reinos italianos perderam a primazia na luta pelo conhecimento e Paris sofreu os efeitos como capital de uma monarquia papista. A Igreja da Reforma e do protestantismo encampou o movimento científico com reflexos que marcaram a cultura germânica, em especial. 
Desastroso quando a escolha recai em valores que não mais resistem à vã geografia da alma humana, no intuito de apenas defender a soberania adquirida à custa de sortilégios que invalidaram a virtude e revelaram a dificuldade de despojar-se do orgulho do dogma.

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Antonio Carlos Gaio
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