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365 CARTAS

Eis que num asilo um casal idoso vive em quartos separados. Ele lá se encontra por opção; ela, em consequência de uma demência senil que prejudicou sua memória e que, por vezes, a recupera durante alguns minutos. Todos os dias, ele lê para a senhora um capítulo de uma encantadora história de amor que foi escrita num velho diário. A história consiste no romance de Jeremy Gordon e Sylvie O’Neil, que se conheceram e se apaixonaram num parque de diversões em Seabrook nos anos 1940. Foi o verão mais intenso de suas vidas. Porém, por imposição da família de Sylvie, o casal, loucamente apaixonado, teve de se separar quando as férias acabaram. A família abastada não aceitava que ela, uma jovem de 17 anos com um grande futuro pela frente, se envolvesse com um artesão especialista em peças de madeira. Logo se seguiu a 2ª Guerra Mundial e Jeremy foi convocado para entrar em ação.
Ao longo da guerra, ele escreveu 365 cartas, que foram escondidas pela mãe de Sylvie, empenhada em pôr fim no romance, baseada em sua experiência quando seu avô a impediu de casar-se com um operário. Sylvie, arrasada, não ficou sabendo da ignomínia de sua mãe, imaginando que seu amado a havia posto de lado, não cabendo mais procurá-lo, nem mesmo depois do fim da guerra, dando o caso por encerrado. Jeremy, desolado, pensou que ela decidira acabar com o lindo amor que se desenhou, em razão de tantas cartas não respondidas.
Próximo de morrer, o pai de Jeremy vendeu sua modesta moradia e presenteou o filho, de regresso ao lar, com uma casa em más condições, justamente para que ele a reformasse com sua habilidade em construção e a transformasse na casa dos seus sonhos. Uma nova casa de maiores proporções se levantou, exatamente dentro dos padrões que havia prometido à Sylvie. Bem que tentou prosseguir longe da mulher que amava, mas se tornou um homem solitário, ainda mais depois da morte de seu pai. Nem a companhia de Martha, viúva, supria a falta de Sylvie, embora ela própria soubesse que não faria Jeremy feliz.
Sete anos já haviam passado desde a última carta escrita quando Sylvie ficou noiva de Allan, a quem, de boa-fé, acreditava amar, apesar de frequentemente revisitar Jeremy em seus pensamentos. Allan e Sylvie se conheceram logo que ela se voluntariou para cuidar dos feridos da guerra, sendo ele de família tradicional, o que muito colaborou para que os pais de Sylvie aprovassem o casamento.
No dia da prova do vestido de noiva, Sylvie viu a foto de Jeremy no jornal, fazendo-a relembrar o inacabado amor dos dois. Motivada a passar a limpo essa questão engasgada no coração, Sylvie se dirige incontinente para Seabrook sem contar o motivo da viagem para Allan. Ao rever Jeremy, a chama da paixão juvenil se reacende e consumam o amor impedido por preconceito de classes sociais. O casal deixou-se levar por uma lua de mel sem fim, não escondida de Martha, vindo a confirmar as suspeitas da mãe de Sylvie quanto ao desaparecimento da filha, batendo um arrependimento tardio que a fez devolver as 365 cartas escritas por Jeremy – uma para cada dia do ano.
Sylvie precisava agora decidir com quem queria realmente passar o resto de sua vida.
Provando que as histórias de vida consomem o tempo à medida que a alma vai ganhando corpo nesta encarnação, mesclando fatos e cruzando destinos, juntando uns com os outros, eis que o senhor idoso dá como finda a leitura do “Diário de uma Paixão”, mais um capítulo da espiritualidade que ilumina a trajetória do amor. Ato contínuo, desperta a senhora de memórias apagadas que, de repente, começa a se lembrar de passagens dos tempos de moça, a perceber que Sylvie é ela, até enxergar no homem que todos os dias no retiro lhe dedica horas incontáveis a falar de amor o mesmo homem com quem, afinal, escolheu ficar no passado.
Jeremy logo se apressou em organizar um jantar com velas no quarto do pavilhão em que Sylvie se alojava (ele se hospedava em outro pavilhão), de modo a ela saborear essa notável descoberta antes que se recolhesse de novo à desmemória. Conseguiu autorização do médico responsável para dormirem juntos naquele dia, não sem antes Sylvie pedir para Jeremy sempre estar presente quando ela recobrasse a razão. E se não haveria uma forma de partirem juntos para a grande viagem de maneira a jamais se separarem para todo o sempre.
Suicídio ou eutanásia sugerida, o fato é que Deus os ouviu e amanheceram um nos braços do outro, desencarnados.

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Antonio Carlos Gaio
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